quinta-feira, 23 de agosto de 2012

FIM DE PARTIDA (RS)



"Nada é mais cômico que a realidade"  
Samuel Beckett

A apresentação do espetáculo "Fim de Partida" no Teatro Therezinha Petry Cardona foi de encontro e celebração com a obra de Samuel Beckett. Encontro com o teatro realizado em Santa Maria, cidade do Grupo TEATRO POR QUE NÃO?, e que juntamente com o grupo ATELIÊ DO COMEDIANTE, que participou do 1º Montenegro em Cena, puderam mostrar aqui, uma parcela da produção da cidade, comprovando a qualidade do teatro de Santa Maria. 
A encenação, baseada no texto "Fim de Partida" de Samuel Beckett, discorre sobre a crueldade das relações humanas inseridas num jogo constante de poder.  O fim da vida é condenado pela solidão, no qual, o desespero é tomado por uma total inércia. A relação de autoritarismo e dependência entre o criado Clov e o patrão cego Hamm, é marcado por uma comicidade requintada e altamente reflexiva. Hamm dá as ordens, enquanto Clov obedece. Mas é Clov quem dita a continuidade do jogo, pois ele pode partir a qualquer momento, e então todos morrerão, pois dependem dele para continuar existindo, pois Clov é o único que anda. 
O grupo consegue adaptar o texto rígido de Beckett sem trair o original, mantendo as características que fazem parte do universo hostil e degradante do autor. Rígido, porque o autor é "quase" um encenador de sua própria obra, pois através de suas didascálias consegue colocar a sua voz no palco, e fugir as suas orientações é quase como traí-lo. Mas eu disse que Beckett é "quase" um encenador pois a sua obra é texto, dramaturgia e seu sentido se completa no palco através da encenação. E a jovem diretora Luiza de Rossi, consegue vencer a rigidez e preencher as arestas propostas pela dramaturgia do autor. 
Sempre fico curioso quanto a encenações de textos clássicos, sacramentados e conhecidos pelo público, pois me parece que já existe uma fórmula, uma receita para encená-los, parecendo que o diretor não pode mexer nessa estrutura, ousar, enfim, colocar o seu ponto de vista acerca de determinadas obras. Fico muito chateado quando leio um texto para teatro e após vou assisti-lo e vejo que não há nada de novo em relação a proposta textual. E isto não acontece com o trabalho do Teatro por que não?, pois o grupo corta, adapta, ousa, mas não trai Beckett, pois o cerne, a origem, os conflitos estão presentes na encenação. 
A concepção é bastante inteligente ao utilizar uma paleta de cores interessante, que dá uma coesão a plasticidade da cena, ou seja, os figurinos, maquiagem, cenários, adereços e iluminação tem todos o mesmo tom, com pouca variação de cores e intensidade, o que provoca o olhar do espectador, atentando para o  minimalismo da cena. 
A direção é inteligente, pois soube acentuar o cômico presente no texto, através das ações dos atores, construindo uma densidade que aos poucos vai conquistando o espectador, e isto é mérito da direção que através do ritmo e evolução da cena, vai nos provocando e trazendo questões sobre a humanidade. Outro ponto positivo foi quanto a não utilização de trilha sonora, valorizando as pausas, a respiração, os silêncios necessários para construir e embasar a cena. 
O elenco é excelente. André, Cauã, Felipe e Rafaela são coesos e intensos, pois conseguem construir e sustentar muito bem seus personagens, o jogo entre Clov  e Hamm é impressionante, pois os atores estão entregues, através de movimentos e palavras conseguem construir um jogo preciso e apurado. E a cena com Nagg e Nell retrata personagens parados no tempo, sem nenhuma perspectiva, com um imenso vazio, e a interpretação dos atores consegue criar este niilismo, este aniquilamento da existência, mas a cena daqueles dois seres em estado de decomposição presos a latões é de uma beleza estética e poética bastante apurada que ao assistir pude vivenciar uma das experiencias mais solitárias e o pior é que eu não podia interferir na cena.  
O teatro Por Que não? está de parabéns pela proposta de trazer a tona este texto de Samuel Beckett, bastante atual por tratar sobre as relações humanas, traçando um panorama do homem em sua miséria, crenças e descrenças. E conseguem construir um espetáculo maduro, potente e atual. 

Ficha Técnica:
Texto de Samuel Beckett; Direção de Luiza de Rossi; Atuação de André Galarça, Cauã Kubaski, Felipe Martinez e Rafaela Costa; Iluminação de Juliet Castaldello; Sonoplastia de Daniella Paez; Cenografia e Figurino do grupo; Maquiagem de Aline Ribeiro;

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

ZUCCOS (RS)



"Zuccos" é um espetáculo que veio de Porto Alegre e trata-se de uma adaptação do texto Roberto Zucco de Bernard-Marie Koltès. Pautado na fragmentação, o espetáculo constrói um grande painel repleto de signos que muitas vezes acabam não auxiliando na comunicação com o espetador. O texto do Koltès já é pautado pela fragmentação, mas cada fragmento vai se estruturando e compondo uma rede que traça o perfil do serial killer Zucco. O mesmo não acontece neste experimento de "Zuccos", pois existem micro-cenas que isoladas, acabam não comunicando nada e dentro da grande estrutura aparecem soltas e deslocadas.
São muitos os elementos presente na cena e é preciso ter o cuidado de que cada um esteja ali presente pela necessidade e não para preencher a cena de imagens esteticamente belas. Porque os méritos da peça são justamente essas imagens criadas pelo elenco, que tem disponibilidade e precisão, imagens poéticas como a cena dos balões vermelho, ou até mesmo a cena em que a atriz utiliza a farinha como elemento. São cenas belas, bonitas que funcionam muito bem enquanto plástica, mas que perdem dentro do contexto da dramaturgia, atrapalhando o entendimento da peça. Entendo que a proposta é experimental, mas mesmo trabalhos com este caráter, querem se comunicar com a platéia, com seu interlocutor e por isso sugiro este cuidado em selecionar o que realmente é necessário para se contar a história de Zucco e o que não é. 
Por exemplo, no proscênio do palco a diversas partes de bonecas, assim como nas laterais da platéia existe a presença de painéis cheio de recortes de jornais que não significam nada, estão ali por estar, os restos de bonecas são ótimos, porém não são utilizados em nenhum momento. Outro demérito é a projeção de vídeo, que é bacana, moderna, mas o elenco não pode se tornar refém disso, pois quando não funciona o equipamento a cena tem que funcionar sem este recurso. 
Algumas vezes a ação acaba não se desenrolando, com por exemplo, na cena dos balões vermelhos, que esteticamente é linda, mas acaba caindo na obviedade sem o fator surpresa, pois sabemos de antemão que todos passaram pela experiencia de compartilhar os seus depoimentos. 
A cena do assalto do carro foi reconstruída e consegue alcançar um resultado ótimo. Assim como a cena dos balões. 
Um dos pontos altos foi a inserção de vídeos sobre assassinos da história e me chama a atenção um trecho sobre o Nardoni, pois ali eu achei o que não consegui visualizar durante a peça, ali encontrei o cerne que é a violência e a alteridade humana, e para o jovem elenco falta isso, a potencialidade da violência, a gana, o frágil, humano e animal irracional de Zucco, essas diversas facetas que compõe o perfil deste personagem que pode render e muito dentro do espetáculo. 
Que bom que tem um elenco que consegue sustentar a proposta, mas ainda creio que o caminho seria buscar uma profundidade maior na construção dos personagens e na sua relação com os demais personagens.  No elenco coeso destacam-se as presenças de Catharina Conte e Anna Júlia Amaral, pela presença e força empregada na construção das personagens, conseguindo um pouco melhor que os demais, sair das marcas da cena e agir de modo mais natural.
A trilha sonora executada ao vivo é boa e pontual, auxilia muito na construção da peça, mas a proposta se contradiz quando é utilizada uma trilha mecânica e o músico ali no palco sem fazer nada. A sonoridade provocada pelas facas, que eu chamei de violino de facas, não funciona, pois não significa nada e o som acaba não chegando no público nem tão pouco reverberando na cena.   
Gostaria de parabenizar o coletivo pelas escolhas e soluções e sei o quão difícil é querer explicar Koltès e sua obra, e talvez o mérito da montagem seja este, de fugir dos clichês e tentar buscar vários significados as intenções do autor, e a busca de novas soluções pode ser uma alternativa, mas atentando apenas para não se perder num emaranhado de simbologias que utilizadas de modo demasiado pode significar nada. 

Diretor: O grupo
Autor: O grupo
Contra-regra: 
Sonoplasta: Thiago Tavares, Flavio Aquino e Pingo Alabarce
Criador da trilha sonora: Flavio Aquino
Iluminador: Thiago Tavares
Criador da iluminação: Aline Jones
Maquiador: O grupo
Criador da maquiagem: O grupo
Figurinista: O grupo
Cenógrafo: O grupo
Elenco: 
Anna Júlia Amaral
Paulo Roberto Farias
Isadora Pillar
Aline Jones
Catharina Conte


Diego Ferreira - Comentador Crítico do Montenegro em Cena

O AMOR É UMA FALÁCIA (RS)




"O amor é uma falácia" do Ateliê do Comediante de Santa Maria trouxe ao Montenegro em Cena um arrojado espetáculo baseado na obra de Max Shulman. Arrojado porque consegue construir um trabalho que coloca o ator no centro da cena, e os atores conscientes disso, aproveitam cada segundo que estão no palco, seguros e plenos, corretos em todos os sentidos, respeitando os tempos, as pausas a respiração. O espetáculo é uma ode ao trabalho do ator, um exercício que abomina todo e qualquer tipo de recursos, demostrando que é possível construir um espetáculo interessante apenas com uma luz básica, a utilização de lanternas, a ausência de trilha sonora, e o fundamental: a presença do ator.  André Assmann, Luciano Gabbi e Raquel Guerra que juntamente com Laédio José Martins fazem do despojamento o seu grande triunfo, conseguindo através disso construir uma cena limpa, sendo possível ao espectador acompanhar a trama de forma tranquila, assim como os atores a contam, de um modo tranquilo e isto possibilita a compreensão das ações dramatúrgicas do inicio ao fim. 
Além de todas essas escolhas certas, a peça acaba ganhando um tom didático, no bom sentido, pois explicita o conceito de falácia, além de nos dar vários exemplos, que dão a tônica cômica ao trabalho. 
A direção foi muito feliz em todas as escolhas, o trio de atores é ótimo, mas vou ter que destacar e parabenizar a magistral atuação de André Assmann que confere a sua segura interpretação um minimalismo impressionante, correto no texto e dicção e disponibilidade corporal que Luciano também demostra. Já a personagem de Raquel é carismática e é o eixo da trama e ganha o público principalmente pelo bordão "bacana".
  
FICHA TÉCNICA
Atuação:
André Assmann (Max)
Luciano Gabbi (Petey Bellows)
Raquel Guerra (Polly Espy)

Direção e Técnica: Laédio José Martins


Diego Ferreira - Comentador Crítico do Montenegro em Cena

O AUTO DA CAMISINHA (RS)




"O auto da camisinha" é mais uma grata surpresa dentro do Montenegro em Cena. Um espetáculo que se estrutura a partir do texto de José Mupurunga, um dramaturgo cearense, autor também de "Farsa do Panelada" que foi o texto premiado no 2º Prêmio Carlos Carvalho de Porto Alegre. 
A dramaturgia coloca em evidência a ação desenvolvida em dois planos, o celestial e o terreno, onde desfilam figuras como o diabo e o anjo, personagens que sempre aparecem nos folguedos e dramaturgia popular brasileira, tendo como um bom exemplo Ariano Suassuna e seu Auto da Compadecida.
A peça começa com uma música do Cordel do Fogo Encantado  e logo em seguida é dito um texto que também é do Cordel, demostrando a abertura da direção em agregar outros fragmentos que possam ajudar a contar a história. E na minha opinião o grupo consegue um ótimo resultado na construção do seu espetáculo, dentro de um espaço equilibrado, com a utilização de poucos recursos de cenários. 
O texto, apesar de conter uma métrica, que é uma característica do autor, precisa ser um pouco mais trabalhado, buscando um ritmo mais apropriado, mas mesmo assim percebo que está bem internalizado pelo elenco que é bastante coeso. O sotaque nordestino não chega a atrapalhar a apreciação da peça, penso que o grupo consegue até extrapolar um pouco a caricatura nordestina. 
A trilha sonora executada ao vivo pela bandinha dá um colorido todo especial a cena, pontuando determinadas ações e em alguns momentos são cantadas algumas canções que fazem parte do cancioneiro popular e penso que conseguem alcançar bons resultados com isso. 
Preciso destacar primeiramente a direção de Sabrina Schwan, pela criatividade e coragem em construir um espetáculo belo e poético, repleto de soluções bacanas e inteligentes, concebendo uma montagem que dá valor a visualidade, com uma boa maquiagem, uma paleta interessante de cores dos figurinos e iluminação. Destaco também todo o elenco, alertando apenas para cuidar a respiração em determinados momentos da execução das ações e canções, e deste elenco destaco a atriz Barbara Marmor, que possui um olho que brilha e tem um bom trabalho de interpretação e  também a Bruna Descovi que consegue segurar muito bem a sua personagem. 
O grande barato da montagem é que este tipo de peça poderia cair num pieguismo didático facilmente, mas conseguem ir muito além disso, construindo um espetáculo divertido, correto e repleto de acertos. 

Diretor: Sabrina Schwan
Autor: José Mapurunga
Contra-regra: X
Sonoplasta: O grupo
Criador da trilha sonora: O grupo
Iluminador: Sabrina Schwan e Iago Muller
Criador da iluminação: Sabrina Schwan
Maquiador: Sabrina Schwan
Criador da maquiagem: Sabrina Schwan
Figurinista: Sabrina Schwan
Cenógrafo: O grupo
Elenco: Bárbara Marmor
Andrei Krummenauer
Bruna Descovi
Bruna Sampaio
Sandro Lima Schwan
Pâmela Fogaça

 Diego Ferreira - Comentador Crítico do Montenegro em Cena

AS RECEITAS DA TIA HERTA (RS)




"As receitas da Tia Herta" da Curto Arte começa e vemos um grande cenário realista, que prima pelo detalhe. O fogão, as paredes, os vidros de chá, a janela, a caneca, a água, tudo é real, até mesmo os efeitos de luz que representam os trovões. O espetáculo é uma comédia, que eu poderia chamar de "comédia de costumes", mas estaria me contradizendo, pois a comédia de costumes é um gênero que caracteriza-se pela criação de tipos e situações de época, com uma sutil sátira social, onde Martins Pena é mestre. E "As receitas de Tia Herta" não nos trás nem tão pouco um conflito ou sátira social, apenas motes e histórias cômicas que caracterizam a peça. É uma comédia que tem uma boa dramaturgia, onde Carlos A. Klein consegue captar muito bem as situações que caracterizam o povoado alemão no estado. A platéia adere muito bem a proposta de um teatro popular, que é muito bem feito em todos os sentidos. A direção é pontual, os atores são ótimos na construção dos tipos em cena, mas destaco o trabalho de  Odair Weisheit  como Valdir, pois além de ser muito boa a sua construção, vejo o ator em trabalho, com todo o corpo, transpirando e suando em cena e isto é bom de ver. A trilha sonora é pontual e auxilia no andamento do trabalho. 
O espetáculo tem um ótimo resultado em todos os sentidos: atores bons, direção criativa e pontual, trilha funcional, texto que consegue concentrar a ação e exercer o básico de uma dramaturgia que é ter um inicio, um meio - conflito, e um fim- desenlace, que aliás é muito bem resolvido. Mas tem o essencial que é conseguir ter o espectador ao seu lado. 

Elenco:
Carlos Alberto Klein  – Tia Herta
Cristiano Schenkel – Sérgio
Odair Weisheit  – Valdir
De: Carlos Alberto Klein
Direção: Carlos Alberto Klein


Diego Ferreira - Comentador Crítico do Montenegro em Cena 

FLORES NO ABISMO (RS)



Para começar a análise de "Flores no abismo - Experimento Strindberg" divido abaixo o material enviado pelo grupo a produção do festival: 
Flores no abismo-Experimnto Strindberg, é uma investigação teatral com base no Teatro-Performance apropriando-se do texto”A mais forte”.Conta a história de duas mulheres que ao descobrir estarem casadas com o mesmo homem planejam vingança,o que elas não imaginavam é queo destino lhes reservaria algo inesperado.Angustias,medos,perdas e amor,uma investigação sobre o comportamento humano.
A sinopse do espetáculo já detona que o que podemos esperar da montagem é: 
1º - Um experimento calcado na obra de Strindberg,
2º - Uma investigação teatral
3º - Bases calcadas no Teatro-Performance
O espetáculo decepciona justamente por prometer demais e não cumprir, cria um ambiente inicial propicio para que a narrativa se instalasse no palco e iniciasse a sua comunhão com o público. Mas já na abertura, a cena com as lanternas é rompida rapidamente, já passando para o próximo momento. O cenário é bonito e equilibrado, é bastante funcional e auxilia no desenrolar da peça. 
Surgem algumas imagens interessantes, mas nem o texto que é dito de forma ritualizada nem tão pouco a trilha que é exagerada, pontuando toda a ação auxiliam para que essas imagens fossem potencializadas e convergidas para melhor contar essa história baseada em Strinberg. 
As marcas da cena não permitem que os atores evoluem na composição dos personagens, que utilizam uma métrica no dizer o texto, tornando-o totalmente rebuscado. Mas há uma exceção, no caso dos diálogos de Bruna Stefany e Joana Guerreiro que em alguns momentos conseguem vencer essa rigidez do texto e fugir um pouco desta métrica, mas podem evoluir muito ainda. 
A movimentação é suja, desnecessária e me faz pensar que o que estou assistindo trata-se de uma miscelânea de linguagens, dentro de uma proposta boa, mas mal executada. O espetáculo com tudo isso acaba ficando chato e sem sentido, e isso que eu adoro propostas que a primeira vista não tenham sentido, mas que no decorrer vão desvelando informações e significados. 
Me dei o trabalho de contar o intervalo que a peça ficou sem a presença da trilha sonora, exatos 6 segundos, e um trabalho como este que precisa de momentos de tensão, de pausas e principalmente precisa de SILÊNCIOS. 
A dicção dos atores não é boa, mas isso se acentua principalmente nos meninos. 
O grande mérito é o de ousar na escolha deste texto e deste autor, demonstrando a coragem de experimentar, e minha dica é esta, não desistam desse caráter experimental, mas experimentem conscientes do tipo de proposta que estão querendo trabalhar. 

Diretor: Douglas Castro
Autor: Estudo feito a partir da Obra “A mais forte” de August Strindberg
Contra-regra: Roger Szortyka e Eduardo Michelsen
Sonoplasta: Karol Santos
Criador da trilha sonora: Douglas Castro e Luis Botelho
Iluminador: Douglas Castro
Criador da iluminação: Douglas Castro
Maquiador: Gilson Leonardo
Criador da maquiagem: Gilson Leonardo e Douglas Castro
Figurinista: Gilson Leonardo e Karol Santos
Cenógrafo: Priscila Pinzon,Franciny Almeida e Roger Szortyka
Elenco: 

Bruna Stefany
Joana Guerreiro
Lia Santos
Juliane Cardozo
Filipe Maciel
Johnny Cairuga

Diego Ferreira - Comentador Crítico do Montenegro em Cena

QUASE AMORES (RS)



"Quase amores" é uma adaptação do livro "Dez (quase) amores" de Cláudia Tajes realizada por Ana Makki para o Grupo OTC. O livro retrata a vida de Maria Ana e seus encontros e desencontros amorosos. A adaptação para o palco é correta, mas não adequada para este grupo de jovens atores. Penso que este tipo de texto não é o mais adequado para ser trabalhado com jovens. Primeiro por se tratar de um texto que não é dramaturgia, e penso que ao se trabalhar com jovens o bacana seria selecionar um texto, que a priori, pudesse auxiliar na construção do espetáculo favorecendo a construção de personagens que fossem mais palpáveis aquele grupo, pois aí poderia ocorrer uma  internalização dos personagens, e os atores poderiam se ajustar melhor dentro do contexto. E isto é uma função do diretor, ter essa visão exterior, uma visão sistêmica de enxergar o que o seu elenco pode render em determinado contexto. Existe uma infinidade de textos que vão ao encontro da proposta de teatro jovem que pudesse melhor aproveitar o elenco, proporcionando a este elenco uma maior diversão em cena,  que não ocorre aqui. 
Para mim este é o problema chave, como o elenco é demasiado jovem não consegue se apropriar das questões abordadas pela narrativa da peça, e acabam apenas seguindo as marcas, pois é lógico, estes pequenos não tem estofo para contar a história de relações amorosas que ainda não vivenciaram. Daí as ações e interpretações são construídas em cima de esteriótipos, sem ritmo deixando uma infinidade de vácuos na ação, cada vez que um personagem se deslocava em direção a arara de roupas e adereços localizada no centro do palco,  este tempo não era utilizado para nada. Outra questão é a presença desta arara em cena, na minha opinião, ela não precisava nem existir, nem tão pouco as roupas e acessórios, pois não acrescentam em nada na ação, pelo contrário, atrapalham e deixam a cena bastante literal. Como sugestão eu aboliria todos os elementos, deixaria apenas os pufes, e investiria na construção de cada personagem, de cada tipo ou de cada esteriótipo, mas sem a utilização e troca-troca de roupas, o que acaba sendo apenas uma bengala para o ator, pois não altera em nada nos personagens. O figurino preto básico funciona muito bem e poderia ser assumido enquanto teatralidade, e ao invés de a cada troca de personagem eu trocar de roupa, experimentar trocar o corpo do ator, a voz, o deslocamento, sem acessórios, apenas no trabalho do ator, creio que otimizaria a questão do tempo, equalizaria a questão espacial e ainda por cima poderia auxiliar na construção de um outro ritmo, necessário em montagens como esta, que trabalha através da composição e desconstrução de tipos. 
Os atores agem como atores-narradores, outro aspecto que não funciona porque o narrador tem o mesmo tônus do personagem, (ou melhor não tem tônus, nem físico nem vocal, não acontece uma diferenciação). 
Ao elenco sugiro que esqueçam as marcas da direção e que procurem se divertir em cena, as situação apresentadas podem ser engraçadas, não pela piadinha gratuita, mas pelo modo como cada ator abordar seu trabalho. 
A montagem apresenta uma sucessão de equívocos em sua execução, como por exemplo: Matheus Kleinubing com seu personagem Reginaldo consegue construir um tipo engraçado, porém enquanto conversa com sua colega de cena, não olha para ela, mas sim para a platéia, uma especie de triangulação, outra cena é a da churrascaria, onde os elementos são objetos invisíveis  mas então porque colocar as roupas dos personagens? É isso que eu sugiro, de decidir qual linguagem vai utilizar e investigar a fundo, trabalhar a força do elenco, brincar mais com as nuances da iluminação, pois ela pode ser o delimitador do espaço e dar esta diferença que não é alcançada com a simples troca do figurino. 
Cássio poderia amarrar melhor todos os elementos e seguir adiante com a peça, mas tentando provocar neste elenco uma tensão, e esta tensão transformada em ação e energia. 

Ficha Técnica: 
Diretor: Cássio Schonarth
Assistente de Direção: Laura Trein
Autor: Adaptação de Ana Makki para o texto “Dez (quase) Amores” de Cláudia Tajes
Contra-regra: Matheus Chisté
Sonoplasta: Cássio Schonarth
Criador da trilha sonora: Cássio Schonarth
Iluminador: Ana Makki
Criador da iluminação: Ana Makki
Maquiador: Ana Makki e OTC
Criador da maquiagem: Ana Makki
Figurinista: Leopoldo Schneider
Cenógrafo: OTC – Oficina de Teatro do Clak
Elenco: 
Amanda Pietra Varela
Carolina Conte Simon
Felipe Chisté
Gabriela Waszlavick Silva
João Pedro Caron
Matheus Kleinubing
Matheus Wollmann da Costa
Natalia de Oliveira Martins
Nathália Steffen

Diego Ferreira - Comentador Crítico do I Montenegro em Cena


A LENDA DA COBRA GRANDE (RS)


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"A lenda da cobra grande" do Grupo Só Deus sabe, de Maquiné foi uma grata surpresa dentro da programação do Festival Montenegro em Cena. Um espetáculo repleto de acertos e méritos, a começar pela adaptação do texto homônimo de Carlos Carvalho, uma grande brincadeira, levada muito a sério pela equipe da peça. A concepção do espetáculo prima pelo detalhe, demostrando que com competência e criatividade se consegue realizar um bom espetáculo, e "A lenda da cobra grande" é muito bom teatro. 
A dramaturgia adaptada pelo Rodrigo Azevedo é transformada em ação, através de um trabalho que conseguiu amarrar muito bem todos os elementos da cena para contar esta história. O texto se utiliza de uma metalinguagem onde as atrizes estão ensaiando uma peça para contar a lenda da cobra grande, mas quando dão-se conta, já estão no centro da cena realizando a apresentação para o público. 
O jogo e a brincadeira estão presentes em todo trabalho, assistimos a muitas cenas de coro, de grupo, que são feitas e desfeitas de modo orgânico, coletivo, tranquilo. Os figurinos de Marli Munari e Rodrigo Azevedo, além de bonitos, são extremamente eficazes na composição das cenas, pois o material, textura e cor consegue um jogo muito equilibrado com a pontual iluminação que torna a cena esteticamente bela. Outro acerto é a ambientação cênica, equilibrada e funcional, sendo que as caixas de madeira conseguem contribuir muito no desenrolar da trama, aliadas as projeções realizadas através do teatro de sombras, que poderia ser um pouquinho mais aproveitada de tão bom que era. A solução encontrada para materializar a cobra com a silhueta da cabeça e o corpo com as caixas verdes é de extremo bom gosto e criatividade, impactando o espectador e com elementos tão simples e este é um dos méritos da produção, conseguir potencializar materiais e adereços tão simples tirando o máximo de teatralidade deles. Existem ainda outros elementos que auxiliam na concretização da encenação como o tecido ao fundo onde aparecem as cabeças das pessoas que a cobra engoliu, as velas, as mascaras, além da sonoridade que é muito precisa e bem executada. Duas cenas que para mim são destaque: a divertida cena do gol com as placas costuradas nas saias das atrizes, criativa e surpreendente, e a cena da procissão com as velas que além de ser linda é engraçada. 
Parabéns ao elenco que é homogêneo, onde todas as atrizes estão muito bem em cena, super a vontade sem estar apenas seguindo as marcas propostas pela direção e parabéns ao Rodrigo Azevedo que consegue criar um espetáculo limpo, criativo, com soluções criativas e surpreendentes que fazem o espectador embarcar nesta viagem bonita que é o universo teatral.  

Ficha Técnica

Duração: 40 minutos Diretor: Rodrigo Azevedo
Autor: Carlos carvalho
Contra-regra: O grupo
Sonoplasta: O grupo
Criador da trilha sonora: O Grupo
Iluminador: Rodrigo Azevedo
Criador da iluminação: Rodrigo Azevedo
Maquiador: Rodrigo Azevedo
Criador da maquiagem: O Grupo
Figurinista: Marli Munari e Rodrigo Azevedo
Cenógrafo: O Grupo
Elenco: 
Joana Dalpiaz 
Alícia de oliveira 
Diessica 
Fabiana Stefen Munari 
Renata 
Izadora Gonçalves 
Thassia lemos 
 Luisa Lemos 
Ivana Munari 


Diego Ferreira - Comentador Crítico do I Montenegro em Cena

EU TE AMO (RS)


"Eu te amo!" é uma adaptação do texto "Quando as máquinas param" de Plínio Marcos realizada pelo Grupo Balança mas não cai. Confesso que textualmente a proposta decepciona e muito, pela ousadia de  Allan Klaus negar o texto de um dos melhores dramaturgos brasileiros ao lado de Nelson Rodrigues. Se eu retiro o que o Plínio me dá de melhor, qual o sentido de montar um texto seu? Nenhum! 
Quando as máquinas parar tem um discurso que projeta uma realidade social, onde a poética de sua dramaturgia está associada a marginalização e a denúncia da degradação e miséria humana e o Grupo Balança mas não cai ignora isso e constrói um espetáculo correto, porém injusto com o propósito de levar Plínio para o palco. Adaptações e experimentações acercas de obras conhecidas e consagradas são sempre bem vindas desde que o cerne seja mantido, desde que eu, enquanto artista queira se utilizar da voz de determinados autores para estar colocando a minha visão acerca daquela obra, daquele contexto, mas ora pegar um texto como este e dar uma conotação romântica dos anos 40? Realmente não consigo entender o que levou Allan a fazer isso. É até aceitável que a história seja interessante, mas para mim o mais importante são os conflitos existentes na obra e isso passa quase batido. 
Enquanto encenação a direção que também é do Allan consegue construir um espaço interessante, naturalista, assim como a construção das personagens, um figurino equilibrado, com exceção da touca de dormir utilizada por Lola que provoca o riso da platéia numa cena que eu considero não ser engraçada, justamente por estar fora de contexto. A trilha sonora além de ser mal operada, não auxilia na construção de climas, e as vezes é de extremo mau gosto, como no caso da trilha incidental do filme "O mágico de Óz" , que deixa a cena piegas e a extensão é demasiada e acaba na cena em que Lola está rezando, tornando-a desinteressante e a música acaba não criando a densidade necessária a cena. Outra questão é que a trilha não precisa servir de referencia para entrada e saídas dos personagens, pois quando ocorre um erro como aconteceu hoje o ator não estará preso a está marca. 
E por falar em densidade, creio que falta uma profundidade na construção do personagem Lola, está muito boazinha, limpinha nos gestos e fala, creio que precisaria sujar mais o comportamento desta personagem, criar uma personagem mais humana e menos heroína e atentar para as mãos crispadas e sem ação. Já a construção de Antônio é forte e mais intensa, acredito bastante na figura de Allan que acaba deslizando apenas no final com a consumação da tragédia, mas está inteiro e verdadeiro e também não sabendo muito onde colocar as mãos, sendo que as vezes quer colocar no bolso e não acha os bolsos ficando no meio do caminho
O grupo precisa repensar os buracos criados na cena, vários momentos o palco fica sozinho, sem nada acontecendo, talvez nem precisasse sair de cena para solucionar esses vácuos. O biombo preto serve como uma coxia para troca de figurinos, mas fiquem atentos pois tem uma cena acontecendo com Allan no foco, mas o meu olhar desvia para atrás deste biombo pois se consegue enxergar a atriz trocando de roupas e não é nem a personagem quem troca e sim a atriz, detalhes que podem ser repensados para melhor apresentar o espetáculo. 
Em suma, se tem um espetáculo interessante, que tem uma força, se sustenta, mas o problema maior é a traição ao Plínio Marcos, inaceitável pela forma como foi executada, pois se fosse me dito, este espetáculo foi escrito por fulano e ponto, eu não teria a referencia do Plínio entende? Eu não estaria comparando e querendo saber o que aconteceu com o texto original, mas partiria do zero, o que não posso ignorar aqui. Outros detalhes que se forem trabalhados de forma consciente podem render bons frutos ao grupo. 

Grupo: Cia de Artes Cênicas Balança mais não cai
Peça: Eu te amo
Cidade: Campo Bom
Direção: Allan Klaus

Este espetáculo integra a programação do: 


PRA CADA SAPATO UM PATO (RS)



"Pra cada sapato um pato!" veio representar Novo Hamburgo no Festival de Teatro Montenegro em Cena. A cena inicia com uma espécie de ritual de candomblé, com tambores, velas e um despacho é deixado em cena. Logo em seguida vem um lixeiro que reclama daquele despacho, dizendo que é um absurdo aquele lixo e que ele não vai botar a mão em nada, mas logo em seguida ele se agacha e põe a mão no lixo! Uma das muitas contradições apresentadas pela peça. 
A narrativa da peça gira em torno da situação calçadista de Novo Hamburgo, realidade transformada em dramaturgia pelo Paranóia através das mãos do diretor Luis Fernando Rodenbuch. A exploração da classe operária é o tema central da trama, que levanta uma bandeira que faz parte da realidade dos moradores da região. O espetáculo trás um leque de personagens calcados na caricatura e esteriótipo. Desfilam no palco a secretaria enjoada, o gay, a perua entre outros. Por outro lado a peça apresenta outros personagens que poderiam ter maior profundidade como a operária Jurema e seu esposo que enfrentam problemas de saúde em decorrência dos malefícios causados pela exploração trabalhista. 
A peça poderia ser classificada como Teatro-Empresa, pelo tema proposto, mas como não gosto de rótulos, sendo que para mim teatro é teatro e ponto final, digo que a peça também tem algumas características que não a excluem de ser um espetáculo que funcione fora do ambiente empresarial. 
O elenco é numeroso e conta com muitos jovens e adolescentes, sendo que alguns estariam debutando no palco. Este é um dos grande méritos desta peça, de colocar sobre o palco uma nova geração de atores, que com seus erros e acertos estão em processo de aprendizagem e isto é emocionante. Já o espetáculo em si, deixa em muitos aspectos a desejar, mas tem alguns pontos positivos. 
A ideia da trilha sonora ser executada ao vivo é um ponto bastante favorável, pois valoriza o espetáculo, mas ainda sim poderia ser melhor utilizada, potencializada e apostar de verdade na inserção destas, que as vezes entra timidamente ou com volume baixo. Os atores também poderiam trabalhar melhor a projeção e dicção do texto, pois as vezes não conseguíamos entender o que era dito no palco. 
Uma das coisas que incomoda são aquelas mascaras utilizadas pela banda, que além de não serem bonitas esteticamente, não dizem nada, não auxiliam a contar a história. 
A ideia do ônibus é ótima e esta cena demostra um dos caminhos que o grupo poderia seguir, o de investir na teatralidade, ou seja, ao invés de misturar linguagens, se agarrar em objetos reais e concretos, poderia seguir por este caminho de tornar as ações mais teatrais, menos burocráticas, mostrando ao público que aquilo que estamos assistindo é teatro, que é jogo, que aquele signo é um ônibus, e a platéia lê e interpreta esses signos propostos.  Outro ponto positivo e que exemplifica esta ideia de teatralidade é a utilização das cordas, mas que não é aproveitada, a cena é rápida e logo se desfaz, perdendo uma grande oportunidade de conseguir uma cena funcional dentro da peça.
A dramaturgia peca em lançar para público pequenos dramas e fragmentos de histórias que ao final acabam não se concretizando, como a história de Jurema e o marido, o concurso da Garota Sapatão, o pessoal do teatro que vai até o patrão solicitar patrocínio, o assalto e a consequente morte do patrão, enfim, se criam vários nichos sem grandes conflitos e desfechos. 
A cena final poderia vir a ser impactante se fosse melhor dirigida, mais limpa, pois a imagem da classe operária enterrando o patrão-algoz e jogando sobre ele o produto de seu trabalho, os sapatos, poderia ser impactante, se o cunho político e estético fosse abordado de outra forma e durante todo o desenrolar da trama.   
Mas parabenizo ao Rodenbuch pela logística de trazer todos os seus alunos para o festival e despertar neles este amor pelo teatro e que através desta experiência eles possam seguir adiante produzindo e aprendendo cada vez mais. 

Ficha técnica: 
Diretor: Luis Fernando Rodembuch
Autor: Adaptado por Luis Fernando Rodembuch 
Sonoplasta: Luis Fernando Rodembuch e o grupo 
Criador da trilha sonora: Luis Fernando Rodembuch e o grupo
Criador da iluminação: Luis Fernando Rodembuch
Figurinista: Camila 
Cenógrafo: Luis Fernando Rodembuch



Diego Ferreira - Comentador crítico do I Montenegro em Cena.