sábado, 29 de março de 2014

DESCRIÇÃO DE UMA IMAGEM (RS)

Foto: Rique Barbo


Heiner Müller e a Poesia Imagética

IMAGINE... É a primeira palavra dita em cena... e é assim que eu tentei me comportar diante do espetáculo "Descrição de uma imagem"... Imaginando... Imaginando e me deliciando através da profusão de imagens propostas pela concepção do Grupo Barraquatro. 
O teatro de Heiner Müller ultrapassa o drama através de rupturas, e o que ele escreve já não pode ser considerado uma peça dramática, mas sim uma peça teatral, e é justamente isso a que assistimos nesta encenação sob a direção de Júlia Rodrigues, não temos um espetáculo que toma para si o texto controverso de Müller, mas sim uma concepção que se utiliza da teatralidade e de uma multiplicidade de imagens que não procura a literariedade do texto aberto de Müller, mas sim o potencial teatral da obra. 
A direção de Júlia Rodrigues foi precisa justamente neste sentido, conseguiu explorar os signos da obra sem ser piegas, através de repetições e variações,conseguiu criar uma "poesia imagética" que ao mesmo tempo é bela, é bruta, é surreal, é atemporal, é sexual, mas acima de tudo é humana. Pois o espetáculo mexe com nossos sentidos, nos trás um universo onírico que nos reporta a outros lugares, e é justamente aí que a iluminação de Bathista Freire é extremamente eficiente e bela, pois auxilia na composição deste universo, construindo climas e atmosferas que conferem a cena uma beleza impar. 
A trilha sonora de Ricardo Pavão, além de linda e executada parcialmente ao vivo, nos coloca lado a lado daqueles seres. São melodias, notas, sussurros e sobressaltos que não destoam do todo, pelo contrário, me aproxima da narrativa. Já o cenário de Élcio Rossini que trás poucos elementos, ratifica esse universo e acentua através de suas construções essa vertente que faz do signo e da metalinguagem o seu chão. São elementos cenográficos que ganham vida através da manipulação dos atores. 
O elenco composto por Thiago Pirajira, Kayane Rodrigues e Kyky Rodrigues conseguem através de seus corpos construir um belíssimo espetáculo, repleto de imagens lindas, pois é bastante acentuada a fisicalidade da cena. Seus corpos é que montam este painel de imagens poéticas. O ator e sua presença é que nos reportam a outros espaços. A construção explora muito bem esse ator que não mergulha na psicologia do personagem, pelo contrário, se utiliza da forte presença física para compor o espetáculo. Coeso e muito bem dirigidos, triunfam em cena e tornam esse encontro com Heiner Müller uma experiencia teatral única e inesquecível. 

Direção Júlia Rodrigues
Atuação Thiago Pirajira e Kayane Rodrigues
Participação: Kyky Rodrigues
Figurinos Letícia Pinheiro e Isadora Fantin
Cenário Elcio Rossini
Iluminação Bathista Freire
Trilha Sonora Ricardo Pavão
Preparação Corporal Dagmar Dornelles
Produção Executiva Dani Dutra e Kyky
Direção de Produção: Cecília Daut – Cristallo Produções
Realização Grupo Barraquatro

segunda-feira, 24 de março de 2014

UM PRÍNCIPE CHAMADO EXUPÉRY (SC)

Se o ator é o elemento fundamental no teatro, ele não poderia existir sem um espaço onde se desenvolver. Podemos definir o teatro como um espaço em que estão juntos os que olham e os que são olhados, e a cena como o espaço dos corpos em movimento. E quando este espaço é direcionado ao trabalho que contempla atores-manipuladores e teatro de animação à questão do espaço torna-se mais importante. A Cia. Mútua entende isso muito bem e traduz no espetáculo “Um príncipe chamado Exupéry” sua pesquisa que extrapola o teatro de animação e constrói um teatro que contempla a questão espacial, criando um espaço tridimensional e que o espectador está inserido dentro do espaço teatral. Adentramos no espaço e somos convidados a entrar do espaço ficcional, ou seja, somos convidados a entrar no hangar onde fica o Correio da narrativa e ali, dentro deste espaço que se desvela as aventuras deste aviador. 
O espaço confere a cena uma força poética, pois enquanto espectadores, estamos no centro da ação, onde vislumbramos aviões sobrevoando nossas cabeças, ventanias produzidas com efeitos de fumaças e ventiladores, provocando imagens que nos remetem a outros lugares. Isso tudo é construído sem a utilização de palavras, pois a dramaturgia do espetáculo é construída apenas com a manipulação dos bonecos, objetos e adereços de cena, e esta manipulação é realizada de um modo despojado e teatral, ou seja, os manipuladores não se preocupam em ocultar sua persona atrás dos bonecos, pelo contrário, dialogam com os mesmos, e este jogo é bastante interessante. Conseguem através desta interação imagens poéticas e que emocionam. Mônica Longo e Guilherme Peixoto são bastante pontuais em suas manipulações precisas e despojadas, porém a direção de Willian Sieverdt é elogiosa por conseguir amarrar muito bem todos os elementos do projeto, e são muitos, como a própria criação e manipulação dos bonecos, aviões e esculturas da cena, assim como o próprio espaço, a iluminação precisa e delicada que em muitos momentos fala por si só, (como esquecer os pontos de luz ao fundo, formando as estrelas da noite escura, lindo!), além dos cenários e trilha sonora que pontua e se faz um personagem na peça. 
Trata-se de um projeto lindo, com uma arte gráfica caprichada, voltado a todas as idades, que faz do silêncio poesia. Trabalho de uma simplicidade que torna o ato teatral pura poesia, poesia para ser guardada na memória e no coração. Bravo Cia. Mútua!

Ficha técnica
Roteiro/Dramaturgia: Mônica Longo, Guilherme Peixoto e Willian Sieverdt
Elenco: Mônica Longo e Guilherme Peixoto
Direção: Willian Sieverdt
Cenografia: Jaime Pinheiro
Mecanismos de Bonecos e Cenários: Paulo Nazareno
Sonoplastia e Trilha Sonora Original: Guilhermo Santiago e Paulo Zanny
Engenharia de Iluminação: Giba de Oliveira
Desenhos: Marcos Leal
Figurinos: Lenita Novaes
Escultura dos Bonecos: Mônica Longo
Confecção dos Bonecos: Mônica Longo e Guilherme Peixoto
Operação de Luz: Laura Correa
Operação de Som: Luis Melo
Produção de palco: Fernando Honorato
Designer Gráfico: Leandro De Maman
Pintura de Estrutura Cênica: Luis Melo
Pintura de Bonecos: Luis Carlos Vigarani
Pintura de Cenários: Guilherme Peixoto e Mônica Longo
Preparação de Atores: Ângela Finardi
Consultoria de Pesquisa: Mônica Cristina Corrêa
Pesquisa, Produção e Realização: Cia Mútua