sábado, 1 de junho de 2019

WHATSAPP PARA SHAKESPEARE (RS)

A imagem pode conter: 3 pessoas, pessoas dançando e pessoas em pé

TRADUÇÃO PALATÁVEL AO ESPECTADOR CONTEMPORÂNEO

Especial 14º Palco Giratório

                                                                                                por Diego Ferreira*

"Whattsapp para Shakespeare" é uma grata surpresa em nossos palcos. Primeiro por trazer Shakespeare a tona, porém desta vez de um modo bastante particular. A escritura do Bardo foi traduzida e marcada nos corpos dos bailarinos/intérpretes da Canoas Cia. de Dança, e o espetáculo acerta em cheio, pois Shakespeare é demasiadamente encenado (graças aos deuses!), porém muitas vezes os caminhos não são os melhores. Mas o espetáculo dirigido por Carlota Albuquerque vai na contramão disso e transborda o palco de criatividade e inventividade. Trata-se de um espetáculo híbrido que mescla diversas linguagens como o teatro, a dança, a música e as artes plásticas, que consegue unir o contemporâneo com o universo clássico de Shakespeare. A estética da produção enche os olhos, pois os figurinos de Fabrizio Rodrigues são belos e eficientes em cena, pois se utiliza de materiais como jeans aliados a gola rufo, reutilizando peças de uso cotidiano, transformando em peças cênicas de modo bastante peculiar já característico no trabalho de Fabrizio. 
O coletivo apropria-se de Shakespeare para falar do mundo e das relações hiperconectadas e desencontradas inerentes ao ser humano, o uso de aplicativos e redes sociais que aproximam e ao mesmo tempo afastam e esfriam as relações. A estética da produção enche os olhos, pois mescla imagens oníricas e fantásticas e que para isso funcionasse em cena, foi fundamental a equipe técnica de luxo que a produção tem, como os já citados figurinos de Fabrizio Rodrigues, a iluminação de Guto Greca que pincela e tinge a tela branca com as cores e texturas que são belíssimas demais. Na equipe também Alvaro RosaCosta que assina o desenho de som e é mestre em traduzir em experiências sonoras as sensações corpóreas do trabalho. Outro ponto positivo é a presença do ator Tom Peres que faz este elo entre a narração e a presentificação do autor em cena, dando um tom cômico e aos mesmo tempo situando o espectador no tempo/espaço atemporal da obra. Creio que com este espetáculo Carlota Albuquerque consegue encontrar neste jovem coletivo uma afirmação do seu trabalho e por que não uma renovação de seu próprio trabalho, que acompanho em espetáculos como "E lá na ve no vá", "Mulheres Insones", "Ditos e Malditos", "Piazzolla Coreografo", "O banho", entre outros. 
Diante de tudo isso, é louvável o surgimento e a criação do Canoas Coletivo de Dança que carrega consigo o nome de uma cidade e espero que o município apoie e valorize este e tantos outros grupos da cidade. Mas é importante pelo fato de revelar mais um coletivo forte e vigoroso em cena, onde todos os bailarinos/intérpretes são qualificados e demonstram em cena grande potencial criativo e de internalização das propostas da direção. O coletivo através de seus corpos e suas presenças conseguem o milagre de traduzir o clássico e deixá-lo palatável ao espectador contemporâneo. Realmente um trabalho fantástico.

Ficha técnica:
Concepção e Direção: Carlota Albuquerque
Intérpretes criadores: Carini Pereira, Caroline Fossá, Danielle Costa, Leslie Taubê, Leonardo Patro, Roberto Mendes, Tiago Ruffoni e Tom Peres 
Artista colaboradora: Joana Wiladino 
Produção: Cristina Colares Pereira
Figurino: Fabrízio Rodrigues 
Iluminação: Guto Greca 
Desenho de som: Álvaro Costa 
Vídeomaker: Ricardo Vivian

*Diego Ferreira é Graduado em Teatro/UERGS. Escreve comentários críticos no blog Olhares da Cena. É integrante do Grupo de Estudos em Dramaturgia de Porto Alegre coordenado por Diones Camargo. É jurado no Prêmio Olhares da Cena. Foi jurado do Prêmio do Prêmio Açorianos de Teatro em 2013 e 2018. Professor de Teatro na Unisinos e Unilasalle.