HIBRIDISMO ESTÉTICO ENTRE TEATRO, PERFORMANCE E CINEMA
por Diego Ferreira*
O
fascismo é um conceito que gera muito debate por sua complexidade, movimento
político que se adapta a diferentes circunstâncias e apropria-se de ideais de diferentes
ideologias. De toda forma, o fascismo, enquanto movimento político e social,
possui uma retórica populista que explora assuntos como a corrupção endêmica da
nação, crises na economia ou “declínio dos valores tradicionais e morais” da
sociedade. Além disso, defende que mudanças radicais no status quo devem
acontecer.
O
fascismo é forma radical da expressão do espectro político da direita
conservadora. Partindo desse movimento e conceito no campo da radicalidade
política, o espetáculo “Um fascista no divã” radicaliza a estrutura teatral
propondo um hibridismo cênico visceral no que tange a atuação do ator e também
no apelo estético e político que a obra oferece.
Alexandre
Dill é um dos diretores mais provocativos da cena gaúcha atual, juntamente com
Camila Bauer do Coletivo Gompa justamente por suas criações que não encerram as
narrativas em si mesmas, mas provocam instabilidades que tensionam a relação
entre a obra e o espectador. O caminho autoral do GrupoJogo tem se firmado por
meio da aproximação e experimentação com outras linguagens como dança, teatro, a
música, artes visuais, digitais e audiovisual no que resulta em trabalhos com
uma assinatura própria. E esse trabalho surge justamente pela parceria
estabelecida entre o grupo, Reina Produções e o ator Vinícius Meneguzzi.
“Um
Fascista no Divã” é experiência cênica que não faz concessões alguma, além da
abordagem política extremamente necessária e atual sobre a ascensão de regimes
totalitários no Brasil a partir do nebuloso período político que passamos e que
ainda estamos mergulhados, de certo modo; aliados a um excelente trabalho do
interprete Meneguzzi, que através de um diálogo direto com a plateia consegue criar
um painel caustico em sua moldura e fervilhante no seu discurso. Vinícius cria
três vias narrativas: a primeira é o ator em sua essência, dialogando com o
espectador, evidenciando alguns conceitos e o que o levou a montagem da obra, a
segunda é quando assume o papel de um psicólogo que tem o desafiador caso de um
político com tendências e comportamentos fascistas (qualquer mera semelhança
com a realidade é mera coincidência) . E a terceira é justamente quando
performa o próprio fascista, criando uma instigante figura bestial, quase
infantil que aos poucos vai desvelando o seu pensamento psicopata, sendo que
essa figura é projetada através de vídeos, alias uma marca do grupo e que nesta
produção merece grande destaque para Gabriel Pontes que faz a dramaturgia
e direção audiovisual, e na performance
é um dos elementos que torna o espetáculo radical. O ator, a direção de Dill, e
a direção audiovisual tem muito êxito em seus respectivos trabalhos justamente para
ajustar os tempos e a relação do performer que dialoga grande parte com o
audiovisual, e esta simbiose é perfeita e provocante. Assim como a música “Macho-Rey”
de Ian Ramil que dá a tônica da performance, com ironia e humor que dialoga
muito com a performance.
Nos
últimos anos, aqui no Olhares da Cena sempre destacamos o trabalho do GrupoJogo
que parte de uma pesquisa experimental séria e de investigação cênica. É
notável a maturação do coletivo e o compromisso com a investigação cênica, a
radicalidade nos posicionamentos e propostas, o engajamento em perguntas
sintonizadas com nosso tempo.
FICHA TÉCNICA