domingo, 28 de novembro de 2021

HIPERGAIVOTA -- MOSTRA UMBÚ DE ARTES

 


SUSPENSÃO DO COTIANO ATRAVÉS DE VIVÊNCIA INTERATIVA

por Diego Ferreira – Especial Mostra Umbú de Artes*

HIPERGAIVOTA é uma experiência digital, um desdobramento do espetáculo “Dispositivo Gaivota” do Coletivo Errática. Trata-se de uma plataforma que o espectador vai explorando através dos seus próprios gestos e cliques, e que dentro da Mostra Umbú de Artes o olhar do espectador foi guiado por um integrante do grupo que ia escolhendo em qual das janelas nós íamos olhar, adentrar e experimentar. “Hipergaivota” é uma das melhores experiências artísticas dos últimos tempos pela inventividade, inovação e por permitir ao navegador desbravar outras searas, através de uma vivência interativa e criativa.

Uma peça de teatro desse tempo, para esse tempo, diz o texto de abertura, e de fato se configura dessa forma. Um experimento sobre o tempo. Sobre o espaço, mesmo questionando que espaços são estes, espaços fugazes e efêmeros. Nossos dedos passeiam nervosos por salas, e cada clique abre-se uma nova possibilidade estética, uma nova visão de um pequeno mundo que se agiganta diante de nós. Fragmentos de textos, imagens, performances, sons e uma infinidade de possibilidades de juntar partes de um grande quebra-cabeça emotivo, afetivo e sensorial. O nosso papel enquanto espectador é ir entrando nas salas, absorvendo e sentindo cada proposta, brincar, se divertir e a partir daí se colocar também no jogo, enquanto peça fundamental. Diante de todas as incertezas que vivemos no mundo diante de uma pandemia, quando não sabemos do dia de amanhã, ainda surgem projetos e propostas artísticas que te tiram do eixo, que provocam uma suspensão no seu cotidiano. “Hipergaivota” é um mergulho para dentro, pois enquanto se volta para os dramas e tensões das personagens do universo de Tchekhov, também são desvelados o universo e estrutura dos performes, fragmentos de um cotidiano em suspensão, frestas de banheiros, quartos, salas e quintais, travessias que me reportam de Porto Alegre até Boston, tudo sob um olhar que coloca em evidencia a máquina do fazer artístico, a nova possibilidade de criação a partir do estar dentro, do estar apartado de um todo, do seu coletivo, de sua tribo, mas mesmo assim existe vida, existe criação e existe reverberação potente do lado de cá.

“Hipergaivota” é uma grande possibilidade de composições a partir das cenas e dos dispositivos e das ligações que o espectador vai construindo com partes ou com o todo. Impossível tecer qualquer comentário estilístico ou de atuação quando o projeto requer apenas EXPERIÊNCIA. Sim, uma experiência viva pautada pela usina criativa e virtualizada que é essa “Hipergaivota”. E a exibição dentro da Mostra Umbú terminou com uma performance que brincava com um jogo de composição através de palavras que teve participação dos atores do coletivo de da platéia. UMA EXPERIENCIA VIVA, e que me fez ter o gostinho de voltar ao modo presencial que ainda não tinha experimentado nesse período pandêmico.

Parabéns ao Coletivo Errativa que juntamente com o Grupojogo não somente agora, mas a algum tempo tem ventilado as artes cênicas do estado com propostas inventivas e inovadoras mas sem desconectar do humano, e por isso são projetos universais.      

Ficha técnica

Direção e Concepção: Francisco Gick

Dramaturgia e Código: Francisco Gick a partir de “A Gaivota” de Anton Tchekhov

Adaptação: Coletivo Errática

Elenco: Claudio Loimil, Jezebel De Carli, João Pedro DeCarli, Guega Peixoto, Luan Silveira, Gustavo Dienstmann, Mani Torres e Nina Picoli

Trilha Sonora: Vitório O. Azevedo

Figurino: Gustavo Dienstmann

Concepção e Criação de plataforma: Francisco Gick

Duração: 60 min

Recomendação etária: 18 anos


*Diego Ferreira é Dramaturgo, Diretor, Professor e Crítico Teatral. Graduado em Teatro UERGS/2009. Estudou Letras na FAPA/2002.  Coordena o Núcleo de Dramaturgia do Espaço do Ator. Editor do blog Olhares da Cena. Professor do Espaço do Ator e da extensão na UNISINOS. Produziu “Três tempos para a dramaturgia negra no RS” contemplado no edital Diversidade nas Culturas da Fundação Marcopolo. Foi indicado no Prêmio Açorianos 2021 em 3 categorias: Olhares da Cena na categoria Ação Formativa e o projeto "Três tempos para a dramaturgia negra no RS" nas categorias Ação Formativa e Ação Periférica.

 

CLASSE CORDIAL - MOSTRA UMBÚ DE ARTES

 

O IMAGINÁRIO DA LOUCURA EM CLASSE CORDIAL

 

Por Diego Ferreira - Especial MOSTRA UMBU DAS ARTES*

 

"Classe Cordial" é um projeto hibrido que mistura teatro, vídeo e performance. O projeto faz uma abordagem sobre exclusão, loucura e reformas antimaniconiais que se projeta no tempo/espaço através do poético e performático numa perspectiva do imaginário social, mobilizando questões que através do texto e poesia da dramaturgia de Thiago Silva e da presença da Deborah Finocchiaro multiplica essas vozes que falam de opressão, de encarceramento, exclusão, e de privações de direitos humanos.  Um corpo no espaço. Uma atriz. Uma tela. Uma janela. Um corpo no espaço que provoca tensões através do silenciamento. Um corpo no espaço habitado por vozes, palavras e sons. Som e presença. Som e poesia. Poesia sonora primorosa de Ângelo Primon que preenche as arestas e cava espaços nessa narrativa de clausura. A dramaturgia de Thiago Silva ganha vida através de uma leitura visceral realizada pela Deborah Finocchiaro, as palavras de Thiago ganham peso e sentido através desse experimento dirigido pelo jovem e experiente Jardel Rocha que nesse trabalho transborda criatividade e o que vemos é uma segurança criativa e inventiva num terreno que talvez não seja o dele que é essa arte digital que dialoga com a performance, o teatro, o cinema, mas que ele triunfa. O texto é poético, político, é denuncia, é história, é dramaturgia necessária justamente nesse tempo de clausura que vivemos. Um texto profundo e aprofundado que traz a luz temas que muitas vezes as pessoas querem esquecer. 

Taí mais um projeto pandêmico que consegue se sobressair no meio de tantos projetos que não conseguiram se adaptar a essa nova realidade do fazer artístico. Uma parceria de sucesso entre as duas companhias Nômade: Teatro e Pesquisa Cênica e Companhia de Solos & Bem Acompanhados

 

 

 

FICHA TÉCNICA Ideia Original e Dramaturgia: Thiago Silva Concepção de Encenação e Direção: Jardel Rocha Atuação: Deborah Finocchiaro Trilha Sonora Original: Angelo Primon Iluminação: Everton Wilbert Vieira Figurinos: Deborah Finocchiaro e Jardel Rocha Chapéu : Rosina Duarte Assessoria de pesquisa: Gabriela Touguinha Tradução para libras: Celina Nair Xavier Neta Edição e finalização: Jardel Rocha Produção do projeto: Jardel Rocha Assessoria de imprensa: Bebê Baumgarten Parceria cultural: Nômade: Teatro e Pesquisa Cênica e Companhia de Solos & Bem Acompanhados Apoio: Fundação Ecarta, FM Cultura - 107.7 e Rádio Univates FM 95.1 Projeto executado através do Edital Criação e Formação Diversidade das Culturas realizado com recursos da Lei Aldir Blanc n° 14.017/20.




*Diego Ferreira é Dramaturgo, Diretor, Professor e Crítico Teatral. Graduado em Teatro UERGS/2009. Estudou Letras na FAPA/2002.  Coordena o Núcleo de Dramaturgia do Espaço do Ator. Editor do blog Olhares da Cena. Professor do Espaço do Ator e da extensão na UNISINOS. Produziu “Três tempos para a dramaturgia negra no RS” contemplado no edital Diversidade nas Culturas da Fundação Marcopolo. Foi indicado no Prêmio Açorianos 2021 em 3 categorias: Olhares da Cena na categoria Ação Formativa e o projeto "Três tempos para a dramaturgia negra no RS" nas categorias Ação Formativa e Ação Periférica.



sábado, 27 de novembro de 2021

A MULHER ARRASTADA - MOSTRA UMBÚ

 




Por Diego Ferreira - Especial MOSTRA UMBU DAS ARTES*

“A Mulher Arrastada” foi o espetáculo de abertura da Mostra Umbú das Artes que nasce com o propósito de reunir diversos trabalhos realizados durante a pandemia por artistas e coletivos teatrais, em diversos outros formatos que não o teatro em sua essência. Nascidos mutantes, são trabalhos que se equilibram na corda bamba dos “entres”: ora investigando sua relação com o cinema, ora desbravando o meio virtual como possibilidades de novas linguagens artísticas. Expressões das artes cênicas que, através de diferentes ferramentas, encontram a sala de cinema como janela de contato com o seu público, de forma segura e presencial.

Assistir “A Mulher Arrastada” na telona foi uma experiência arrebatadora. Pude experimentar o espetáculo de modo presencial, online e agora no cinema. Penso que o trabalho funciona e emociona em qualquer plataforma que se utilizar pelo material humano que a narrativa convoca o espectador a comungar. A experiência na telona agiganta ainda mais esse manifesto que evoca o episódio ocorrido no Rio de Janeiro,  uma ode contra o apagamento da memória de Cláudia da Silva Ferreira, mulher, negra, pobre, mãe que foi brutalmente assassinada e arrastada pela PM/RJ. 

A escrita de Diones Camargo me toca de uma forma intensa, justamente por criar narrativas que evoquem vozes que cada vez mais precisam ser exaltadas, vozes como esta ecoem e não sejam caladas, busquem o seu lugar de fala, buscando por si só o lugar de protagonismo sem a necessidade de mediação de terceiros. “A mulher arrastada” é um texto que a começar pela estrutura, eclode o drama assim como ocorre em autores pós-modernos, colocando em cena monólogos e vozes.

O texto é permeado de memórias fragmentárias e inconstantes, ficção e realidade andam juntas, também a dimensão do tempo está desconstruída: não há noção de passado e presente, separação de eu e outro; em caráter de hibridismo (o texto é um poema dramático, narrativo, concreto, e extremamente político, uma peça manifesto); um novo estado de expressão e percepção em uma escrita que é distante da estrutura tradicional de enredo. A fragmentação do sujeito contemporâneo é alcançada esteticamente com a utilização de recursos como as figuras do HOMEM/POLICIAL que tem a função de situar os passos de Cláudia, a utilização de uma narrativa não linear, não especificação das personagens e do cenário, distorção do senso de realidade e de tempo. 
A interpretação irretocável de Celina Alcântara que é simplesmente arrasadora, meticulosa e espetacular. Na tela grande Celina alcança uma força ainda maior nas vezes em que o close está focado em seu rosto. Impossível assistir a performance de Celina e não ser tocado, não ser perturbado pela força com que representa a personagem. Pedro Nambuco está no mesmo patamar de Celina e me assombra apenas através de sua presença, pois representa a força e a truculência policial branca, representa toda a bestialidade dos militares que tomam conta do poder e do estado. Nambuco representa um personagem que me dá asco, de certa forma, desde suas palavras iniciais, durante a violência que trata a mulher arrastada e até mesmo quando não tem falas, nem tampouco está em cena, mas apenas pelo fato de percebermos sua presença rondando o espaço como um lobo faminto. A dupla de atores está de parabéns pelo excelente trabalho. Assim como a direção de Adriane Mottola, que soube concatenar todos os elementos da encenação, partindo do texto de Diones, e explorando o melhor dos atores. Direção primorosa que parte de elementos simples para chegar num trabalho arrojado. 
Impossível não citar a iluminação funcional de Ricardo Vivian, que além de iluminar o espaço da cena onde os atores atuam, cria uma luz perfeita que dá conta de todo espaço, desde a entrada até atrás das arquibancadas criando um ambiente muitas vezes sufocantes, como a trilha sonora de Felipe Zancanaro que se faz presente em grande parte da cena, de forma sutil, operada ao vivo, uma experiência sonora que auxilia muito na construção emotiva do filme-espetáculo. 
Sigamos clamando: Claudia da Silva Ferreira, presente!

 


FICHA TÉCNICA


Direção: Adriane Mottola Texto:Diones Camargo Elenco:Celina Alcântara e Pedro Nambuco Iluminação:Ricardo Vivian Trilha Sonora:Felipe Zancanaro 



*Diego Ferreira é Dramaturgo, Diretor, Professor e Crítico Teatral. Graduado em Teatro UERGS/2009. Estudou Letras na FAPA/2002. Coordena o Núcleo de Dramaturgia do Espaço do Ator. Editor do blog Olhares da Cena. Professor do Espaço do Ator e da extensão na UNISINOS. Produziu “Três tempos para a dramaturgia negra no RS” contemplado no edital Diversidade nas Culturas da Fundação Marcopolo. Foi indicado no Prêmio Açorianos 2021 em 3 categorias: Olhares da Cena na categoria Ação Formativa e o projeto "Três tempos para a dramaturgia negra no RS" nas categorias Ação Formativa e Ação Periférica.



 

sexta-feira, 19 de novembro de 2021

OLHARES DA CENA É INDICADO AO PRÊMIO AÇORIANOS 2021

 

INDICAÇÕES AO PRÊMIO AÇORIANOS DE TEATRO ADULTO

Ontem saiu a lista de indicações ao Prêmio Açorianos de Teatro Adulto e o Olhares da Cena foi indicado na categoria Ação Formativa.
Desenvolvemos um trabalho de crítica a mais de 10 anos, de intelectualidade negra, pois por detrás de todos os textos está a figura de Diego Ferreira, que é crítico teatral, dramaturgo e professor e decidiu enveredar para o lado intelectual da arte por perceber que nesse nicho ainda existe poucos negros por falta de espaço e incentivo, sendo um espaço que é extremamente difícil de se colocar e de ser reconhecido.

Indicados Açorianos de Teatro Adulto

Espetáculo
206820
A última Negra
A Vó da Menina     
Foi o Que Deu Para Fazer
Hipergaivota

Direção
Camila Bauer por Derrota
Camila Bauer e Bruno Gularte Barreto por A Vó da Menina
Dilmar Messias e Gabriel Messias por De Profundis: Epistola in Cárcere et Vinculis
Francisco Gick por Hipergaivota
Maurício Casiraghi por 206820
Vitória Titton por Foi o Que Deu pra Fazer

Artista/Performer Masculino
Eduardo Dávila por Manual para Naufragos
Elison Couto por De Profundis: Epistola in Cárcere et Vinculis
Jardel Rocha por A Classe Cordial
Lauro Fagundes por Foi o Que Deu pra Fazer
Paulo Flores  por Leitura Drama-Cinematográfica Instruções para Abraçar o Ar

Artista/performer Feminino
Debora Finochiaro por A Classe Cordial
Hayline Vitória por a Última Negra
Laura Hickman por A Vó da Menina
Liane Venturella por Palácio do Fim e Derrota
Sandra Dani por A Vó da Menina

Destaque técnico
206820
A Vó da Menina
Foi o que deu pra fazer

Ação Formativa
A Última Negra
Laboratório de Montagem Cênica Exclusivo para Travestis e Transexuais
Olhares da Cena - Crítica e memória do teatro gaúcho
Três Tempos para a Dramaturgia Negra no RS: Formação, Reflexão e Memória

Ação Periférica
Hipergaivota
Preta Poesia Feminina
Três Tempos para a Dramaturgia Negra no RS: Formação, Reflexão e Memória

quarta-feira, 29 de setembro de 2021

CLASSE CORDIAL (RS)

 


O IMAGINÁRIO DA LOUCURA EM CLASSE CORDIAL

*por Diego Ferreira

"Classe Cordial" é um projeto hibrido que mistura teatro, vídeo e performance. O projeto faz uma abordagem sobre exclusão, loucura e reformas antimaniconiais que se projeta no tempo/espaço através do poético e performático numa perspectiva do imaginário social, mobilizando questões que através do texto e poesia da dramaturgia de Thiago Silva e da presença da Deborah Finocchiaro multiplica essas vozes que falam de opressão, de encarceramento, exclusão, e de privações de direitos humanos.  Um corpo no espaço. Uma atriz. Uma tela. Uma janela. Um corpo no espaço que provoca tensões através do silenciamento. Um corpo no espaço habitado por vozes, palavras e sons. Som e presença. Som e poesia. Poesia sonora primorosa de Ângelo Primon que preenche as arestas e cava espaços nessa narrativa de clausura. A dramaturgia de Thiago Silva ganha vida através de uma leitura visceral realizada pela Deborah Finocchiaro, as palavras de Thiago ganham peso e sentido através desse experimento dirigido pelo jovem e experiente Jardel Rocha que nesse trabalho transborda criatividade e o que vemos é uma segurança criativa e inventiva num terreno que talvez não seja o dele que é essa arte digital que dialoga com a performance, o teatro, o cinema, mas que ele triunfa. O texto é poético, político, é denuncia, é história, é dramaturgia necessária justamente nesse tempo de clausura que vivemos. Um texto profundo e aprofundado que traz a luz temas que muitas vezes as pessoas querem esquecer. 
Taí mais um projeto pandêmico que consegue se sobressair no meio de tantos projetos que não conseguiram se adaptar a essa nova realidade do fazer artístico. Uma parceria de sucesso entre as duas companhias Nômade: Teatro e Pesquisa Cênica e Companhia de Solos & Bem Acompanhados



FICHA TÉCNICA Ideia Original e Dramaturgia: Thiago Silva Concepção de Encenação e Direção: Jardel Rocha Atuação: Deborah Finocchiaro Trilha Sonora Original: Angelo Primon Iluminação: Everton Wilbert Vieira Figurinos: Deborah Finocchiaro e Jardel Rocha Chapéu : Rosina Duarte Assessoria de pesquisa: Gabriela Touguinha Tradução para libras: Celina Nair Xavier Neta Edição e finalização: Jardel Rocha Produção do projeto: Jardel Rocha Assessoria de imprensa: Bebê Baumgarten Parceria cultural: Nômade: Teatro e Pesquisa Cênica e Companhia de Solos & Bem Acompanhados Apoio: Fundação Ecarta, FM Cultura - 107.7 e Rádio Univates FM 95.1 Projeto executado através do Edital Criação e Formação Diversidade das Culturas realizado com recursos da Lei Aldir Blanc n° 14.017/20.



*Diego Ferreira é Dramaturgo, Diretor, Professor e Crítico Teatral. Graduado em Teatro UERGS/2009. Estudou Letras na FAPA/2002. Coordena o Núcleo de Dramaturgia do Espaço do Ator. Editor do blog Olhares da Cena. Participou do Grupo de Estudos em Dramaturgia de Porto Alegre coordenado por Diones Camargo. É integrante da GiraDramatúrgica - Grupo de Estudos em Dramaturgia Negra coordenado por Carlos Canarin/UNESPAR. Professor do Espaço do Ator e da extensão na UNISINOS. Produziu “Três tempos para a dramaturgia negra no RS” contemplado no edital Diversidade nas Culturas da Fundação Marcopolo. Curador do 28º Porto Alegre em Cena/2021. Mediador do 15º Palco Giratório Sesc/RS.

quinta-feira, 19 de agosto de 2021

CIDADE AO MAR (RS)

 


RETRATO IMAGÉTICO DO UNIVERSO ADOLESCENTE

por Diego Ferreira*

"Cidade ao mar" é um experimento virtual do Coletivo Prisma. Um experimento novo, de um grupo novo, com gente nova que promove um respiro e suspensão no tempo durante a exibição do experimento. O projeto é dividido em capítulos e se utiliza tanto de uma poesia imagética com belas imagens cotidianas e também de uma poesia textual utilizando algumas referencias poéticas como Edgar Allan Poe e Peter Handke. A tela é uma espécie de tela em branco que os corpos vão preenchendo com suas presenças e também a projeção de alguns fragmentos textuais. As imagens em preto e branco e o cuidado da edição é um grande destaque deste projeto, assim como a linguagem jovem que trás um respiro as cenas projetadas. As narrações e interpretações dos atores são seguras e demostra que essa "gurizada" está levando muito a sério o início da caminhada em seu ofício.     As belas imagens e o roteiro de Bela Becker desvelam memórias que retratam o universo adolescente buscando no mar metáforas que dialogam com essa galera. O mar calmo, as vezes revolto, violento, o mar salgado que refresca, cura e batiza. ou seja, uma geração que carrega consigo uma série de sentimentos, vivências e sutilezas e a mudança destes sentimentos oscila de forma muita rápida. Sentimentos efêmeros e fugazes. E tudo isso está presente aqui, de forma poética e imagética que alcança o nosso imaginário de uma forma muito especial. 
Que o Grupo Prisma possa utilizar esta experiência como alavanca para seguir com novos projetos e em breve, quando essa pandemia acabar, quero revê-los nos palcos.

Ficha Técnica:

Direção: O GRUPO

Roteiro: BELA BECKER

Elenco: BELA BECKER, FERNANDA MIRANDA, JEAN GORZIZA, LAYSA MARY E PEDRO DARGEN

Direção de Arte: O GRUPO

Maquiagem: O GRUPO

Figurino: O GRUPO

Montagem: PEDRO DARGEN

Edição de vídeo: PEDRO DARGEN

Edição de áudio: PEDRO DARGEN

Trilha sonora: PEDRO DARGEN

Direção de Produção: JEAN GORZIZA

Material Gráfico: BELA BECKER E PEDRO DARGEN

Vídeos para Divulgação e Trailer: PEDRO DARGEN

Divulgação nas Redes Sociais: JEAN GORZIZA

Realização: Grupo PRISMA

*Diego Ferreira é Dramaturgo, Diretor, Professor e Crítico Teatral. Graduado em Teatro UERGS/2009. Estudou Letras na FAPA/2002.  Curador local do 28º Porto Alegre em Cena/2021.Coordena o Núcleo de Dramaturgia do Espaço do Ator. Editor do blog Olhares da Cena. Participou do Grupo de Estudos em Dramaturgia de Porto Alegre coordenado por Diones Camargo. É integrante da GiraDramatúrgica - Grupo de Estudos em Dramaturgia Negra coordenado por Carlos Canarin/UNESPAR. Professor do Espaço do Ator e da extensão na UNISINOS. Produziu “Três tempos para a dramaturgia negra no RS” contemplado no edital Diversidade nas Culturas da Fundação Marcopolo.   

domingo, 18 de julho de 2021

ZULEKA E O TESOURO DO PIRATA CARECA (RS)



PRODUÇÃO INTELIGENTE DIRECIONADA AOS PEQUENOS

por Diego Ferreira*

"Zuleka e o tesouro do pirata careca" é uma produção do Laboratório Escola de Arte Popular e  é uma grata surpresa na seara das produções digitais em tempos pandêmicos.  Por se tratar de uma produção voltada as crianças e pelo fato da mesma abordar temas atuais, o coletivo conseguiu criar uma experiência  viva e lúdica aproximando-se da realidade das crianças de hoje. O espetáculo virtual consegue utilizar de modo louvável uma série de plataformas como o you tube, o instagram, o whattssapp para colocar em cena as aventuras de Zuleka no mundo real. Aqui não existe o mundo das maravilhas, fadas ou duendes, pelo contrário, os temas abordados são os que estão todos os dias nos noticiários como pandemia, fake news, isolamento, o medo, o genocídio, a vacina e a relação com familiares separados pelo distanciamento. O que torna a experiência diferente é justamente a forma como foi apresentado, a começar pela dramaturgia e edição dos quadros apresentados no programa de entrevistas apresentado pela Zuleka.  Apesar de a produção ser dirigida aos pequenos existe um discurso político e social bastante claro e apurado. A narrativa não fica em cima do muro e propõe uma reflexão interessante acerca dos temas abordados, mas a forma que esse discurso se manifesta é construído de modo lúdico e inteligente. Não é tarefa fácil dialogar com a infância atual por uma série de ideologias que infelizmente dominam a sociedade brasileira. Mas é importante falar. É importante dialogar. É salutar evidenciar qualquer tipo de tema, principalmente os que estão em alta na sociedade e que interfere diretamente na vida dos pequenos e suas respectivas famílias para assim tentar construir uma sociedade que busque um equilíbrio no campo das idéias.  A dramaturgia de "Zuleka e o tesouro do pirata careca" é espetacular, destaco por exemplo a cena/quadro do formigueiro que estabelece uma relação direta com o governo. Outra cena que destaco é a da avó de Zuleka após ser vacinada se transformar em jacaré. São cenas/quadros muito bem construídos e divertidos. O elenco é um destaque a parte, pois consegue construir figuras interessantes e hilárias como o impagável Tio Miro e sua sereia Elvira  que Rodrigo Reis nos brinda perfeitamente, assim como a personagem título Zuleka personificada pela Pam Magalhães, que tem uma tarefa difícil que é criar corpo/voz a uma personagem infantil, o que acontece de modo natural, pois quanto mais avança o espetáculo mais acreditados na sua construção da menina Zuleka. Vinicius Lima como o Avô e o pirata também está muito bem e seguro na personificação destas figuras que no caso de Vinicius percebo um tempo ótimo principalmente no avô falastrão, assim como Carini Pereira que no papel da avó consegue ser hilária e pontual agregando qualidade no projeto. Os personagens são fora do padrão de um universo infantil romantizado e isso faz com  que consigam dialogar com a nossa realidade. O coletivo assim como Bruno Prandini estão de parabéns pela qualidade e principalmente pela resistência de seguir produzindo trabalhos com muita qualidade dentro da chamada região metropolitana de Porto Alegre. Que este trabalho possa chegar nas escolas e ser um bom exemplo de teatro que faz uma ótima reflexão da criança da atualidade aliada a diversão.      

   

FICHA TÉCNICA

Montagem Coletiva do Laboratório-Escola de Arte Popular

Criação da Dramaturgia, Pesquisa de Referências, Elementos Cenográficos, Figurinos, Trilha Sonora: O Coletivo

Direção Artística: Bruno Flores Prandini

Elenco: Carini Pereira, Pam Magalhães, Rodrigo Reis e Vinicius Lima

Criação de Material Audiovisual: Rodrigo Reis e Pam Magalhães

Edição de Vídeo Espetáculo Digital: Renato Chama

 

Após a transmissão do espetáculo, haverá uma live no Youtube com toda a equipe artística. Para acompanhar acesse o Youtube do Laboratório-Escola de Arte Popular 

 

Este espetáculo integra o projeto “Mostra 10 Gigabytes de História - Vacina para Corpos Digitais” sendo este um Projeto realizado com recursos da Lei nº 14.017/2020. 



*Diego Ferreira é Dramaturgo, Diretor, Professor e Crítico Teatral. Graduado em Teatro UERGS/2009. Estudou Letras na FAPA/2002.  Coordena o Núcleo de Dramaturgia do Espaço do Ator. Editor do blog Olhares da Cena. Participou do Grupo de Estudos em Dramaturgia de Porto Alegre coordenado por Diones Camargo. É integrante da GiraDramatúrgica - Grupo de Estudos em Dramaturgia Negra coordenado por Carlos Canarin/UNESPAR. Professor do Espaço do Ator e da extensão na UNISINOS. Produziu “Três tempos para a dramaturgia negra no RS” contemplado no edital Diversidade nas Culturas da Fundação Marcopolo. Curador do 28º Porto Alegre em Cena/2021.  


domingo, 11 de julho de 2021

DESFAZENDA - ME ENTERRE FORA DESSE LUGAR (SP)

 


SOMOS FEITOS DE POSSÍVEIS
por Diego Ferreira*

Refletir sobre a pluralidade e diversidade do teatro brasileiro na atualidade é indispensável. É salutar também não apenas refletir mas cada vez mais subverter as estruturas desse teatro, evitando a reprodução de modelos, práticas e principalmente narrativas distorcidas que perduraram durante muito tempo. Falar sobre o teatro brasileiro contemporâneo e não ressaltar a grande relevância que os teatros negros tem é no mínimo discutível, (para não dizer outra coisa) é necessário provocar esse diálogo para de uma vez por todas dizer que a produção negra atual é extremamente diversificada e múltipla e talvez a mais rica sob o ponto de vista estético, político e poético. E "Desfazenda - Me enterre fora desse lugar" é um excelente exemplo dessa forte articulação que está acontecendo hoje. A produção é o novo trabalho do Coletivo O Bonde de São Paulo e evidencia o trabalho de quatro excelentes interpretes, quatro corpos, quatro vozes, que propagam, multiplicam e amplificam o pensamento e narrativas de muitos corpos pretos. "Desfazenda" coloca em cena quatro personagens: 12, 13, 23 e 40. São quatro pessoas pretas que quando crianças foram salvas da guerra por um padre branco. Desde então elas vivem na fazenda deste padre, cuidando das tarefas diárias, supervisionadas por zero, um homem preto um pouco mais velho. O padre nunca sai da capela, a guerra nunca atingiu a fazenda, e sempre que os porquês são questionados, o sino soa e tudo volta a ser como antes. Ou quase sempre.
A dramaturgia de Lucas Moura é pautada pela fragmentação e intertextualidade. O discurso narrativo consegue contrastar a fabula como depoimentos pessoais criando uma multiplicidade extremamente interessante. A palavra de Moura é vida, é morte, é arma ao mesmo tempo que é alvo. A palavra é corpo/matéria. A palavra é ficção e fricção de tempos e memórias distintos. A palavra é de Lucas, ao mesmo tempo que é de 40, ao mesmo tempo de que é de Jhonny, a palavra é de 23 ao mesmo tempo que é de Marina, ao mesmo tempo que é de 12, e também 23, assim como a palavra é de Filipe, de Ailton, a palavra é de Roberta, a palavra também é minha. A palavra é texto. E o texto desvela discursos que consegue propagar a partir de sua ação uma infinidades de vozes. Texto é ritmo e poesia. Poesia visceral, urgente e emergente. O texto é estruturado em narrativas épicas evidenciado através da direção espetacular de Roberta Estrela D'alva que consegue criar muitas soluções cênicas e dispositivos que dá um ritmo alucinado ao trabalho, além de muitas camadas. Fiquei extremamente tocado com todo o espetáculo, chamado aqui de "peça-filme", mas confesso que fazia tempo que um texto não captava tanto a minha atenção como essa dramaturgia de Lucas Moura, e olha que isso acontece justamente num tempo em que o teatro chega até a recepção de forma virtual, porém isso não afetou em nada, pelo contrário, pois nesse caso a virtualidade da proposta se transforma em presença potente pelo modo de construção que conseguem cooptar o olhar e principalmente o afeto de quem está do lado de cá da tela. Texto aliado a direção criam um objeto virtual, uma peça-filme que evidencia o caráter espetacular desse modelo sem deixar de ser teatro. Estrela D'alva imprime um ritmo atrelado a toda uma plasticidade carregada numa teatralidade. A começar pelas projeções iniciais com as vozes de Grace Passô e Negra Rosa que além de nos localizar no que estamos prestes a assistir revelam alta carga poética. Depois assistimos os intérpretes se colocando em xeque o tempo topo, construindo e desconstruindo esse imaginário fabular ao mesmo tempo que nos colocam no tempo de hoje, com nossos problemas de hoje, nossas alegrias e nossas dores. Numa das passagens do texto é dito: "a gente precisa arranjar um tempo de desviar". e desviar é mudar de direção. Precisar de tempo para mudar de direção, muitas vezes será que temos esse tempo para desviar? É necessário tempo, é necessário mudar o curso das águas e "Desfazenda" consegue esse tempo para desviar e propõe uma mudança que dialoga diretamente comigo.

E porque dialoga comigo?

Dialoga porque é virtual, mas é presença
É porque é presença, é corpo, é negro
Dialoga porque tem uma fábula, mas também tem reflexão
Dialoga porque tem ritmo, tem fala, língua falada, tem rap
Dialoga porque tem ator que mesmo através da tela fala diretamente comigo
Dialoga porque o ator sou eu, e aquilo que estava escrito nos diários poderia ter sido escrito por mim
Dialoga porque a câmera guia o meu olhar.

A teatralidade latente se manifesta e materializa através da iluminação que é um dos signos presentes e que auxiliam fortemente na construção potente do trabalho. A luz de Matheus Brant executada por Gabriele Souza é espetacular, pois constrói uma estética imagética que também é signo, que também é um tecido narrativo, uma sensível dramaturgia da iluminação que é presente, é corpo, é fundamental. A luz é corte, é interrupção, é interferência, é dispositivo que revela e esconde corpos, desenha e inscreve esse corpo-espaço, num tempo presente e virtual. As cores, intensidades e temperaturas dessa luz são bem articuladas que deixam uma forte marca nessa experiência. Evidencia rostos, corpos ou partes dele, cores, preto e branco, apenas branco, apenas negro, e vermelho. E essas cores, apenas essas três cores me levam a muitos significados e metáforas como o vermelho-sangue das mortes dos corpos pretos que assistimos todos os dias e que infelizmente esse sangue vermelho/preto não é no palco do teatro, nem tão pouco virtual, mas sangue real, sangue derramado todos os dias principalmente nas favelas e periferias do nosso país.
Outro elemento importante é a trilha sonora de Dani Nega que constrói uma linda paisagem sonora, presente o tempo todo, potente e linda, linda demais, já que o texto falado também é musicalidade. O ritmo é a mola propulsora que faz rodar essa experiência. A trilha é um coração pulsando sempre mas que as vezes nem sentimos mas ela está ali presente, pulsando e emanado vida. Outro destaque são os figurinos de Ailton Barros que são funcionais, rico em detalhes mesmo todos sendo peças pretas com o avental branco. Essas cores do figurino e da iluminação dá o tom metafórico da montagem, cria alguns códigos facilmente lidos pelo espectador, como quando os interpretes utilizam o avental branco estão dentro da narrativa fabular, e quando retiram o elemento branco evocam pensamentos e memórias pessoais/coletivas. Percebe que código interessante este:  quando ele , o ator, retira o elemento branco do seu figurino é quando a ilusão fabular se desfaz, ou seja, desfazendo, despindo, desconstruindo pensamentos. Desfazenda. 
Então, a peça-filme é uma enorme surpresa nessa mar de incertezas, e justamente por se tratar de um espetáculo filmado, todo o reconhecimento merecido a toda a equipe de Captação de imagens, montagem e fotografia que faz o espetáculo acontecer da melhor forma possível, com alto impacto e força poética e estética graças aos trabalhos destes profissionais. 
E aos quatro atores/
interpretes/vozes/corpos/subjetividades/forças/respiração/inspiração/transpiração/   
Ailton Barros
Filipe Celestino
Jhonny Salaberg
Marina Esteves
Registro a minha satisfação em partilhar desse momento através desse trabalho. Todos do elenco sem exceções dinamizam e potencializam através de suas presenças diferentes estados de temporalidades. Seus corpos/vozes produzem potencias que muitas vezes contrastam com as violências da narrativa.
Em múltiplas camadas, com ambiguidades e tensões internas naquilo que se pretende fazer, "Desfazenda - Me enterrem fora desse lugar" é um  grito por um aquilombamento e um desvelador daquilo que ainda se custa a ver: as ações fundantes das populações negras e o sangue preto que constitui a estruturação desse país.

Ficha Técnica
Direção: Roberta Estrela D'Alva (@estreladalva) Dramaturgia: Lucas Moura (@lucasmouradr) Direção Musical: Dani Nega (@daninega) Elenco: Ailton Barros (@ailtonbarrosoficial), Filipe Celestino (@ficelestino), Jhonny Salaberg (@jhonnysalaberg) e Marina Esteves (@vimvermarina). Vozes Mãe e Criança: Grace Passô (@gracepasso) e Negra Rosa (@meninanegrarosa). Direção de Imagem e Montagem: Gabriela Miranda e Matheus Brant (@matheusbrant) Direção de Fotografia: Matheus Brant Consultoria Artística: Daniel Lima (@dcfl.daniel_lima) Som direto: Ruben Vals (@rukuraka_) Treinamento e desenho de spoken word: Roberta Estrela D'Alva Produção Musical: Dani Nega Músicas "Saci" e "Tocar o Gado": Dani Nega e Lucas Moura Figurino: Ailton Barros Desenvolvimento de figurino: Leonardo Carvalho (@tchaubeijotudodebom) Operação de câmera e Efeitos óticos: Isadora Brant (@isabrant) Desenho de Luz: Matheus Brant Operação de Luz: Gabriele Souza (@gabezok) Técnica de Iluminação e Traquitanas: Giovanna Kelly (giovannakmg) Marcação de Cor: Lucas Silva Campos e Samira França Design Gráfico: Tide Gugliano (@tidegugliano) Legendas: Francisco Grasso Produção: Corpo Rastreado (@corporastreado) – David Costa, Gisely Alves e Júlia Tavares (@tvrsjulia) Assessoria de Imprensa: Canal Aberto (@canal_aberto) – Marcia Marques (@marciamarquesnovaes), Carol Zeferino e Daniele Valério Realização: O Bonde Dramaturgia livremente inspirada no filme "Menino 23: Infâncias Perdidas no Brasil" de Belisario Franca (@belisariof)



*Diego Ferreira é Dramaturgo, Diretor, Professor e Crítico Teatral. Graduado em Teatro UERGS/2009. Estudou Letras na FAPA/2002.  Coordena o Núcleo de Dramaturgia do Espaço do Ator. Editor do blog Olhares da Cena. Participou do Grupo de Estudos em Dramaturgia de Porto Alegre coordenado por Diones Camargo. É integrante da GiraDramatúrgica - Grupo de Estudos em Dramaturgia Negra coordenado por Carlos Canarin/UNESPAR. Professor do Espaço do Ator e da extensão na UNISINOS. Produziu “Três tempos para a dramaturgia negra no RS” contemplado no edital Diversidade nas Culturas da Fundação Marcopolo. Curador do 28º Porto Alegre em Cena/2021.  

domingo, 27 de junho de 2021

DERROTA (RS)

 

DIMENSÕES ÍNTIMAS E SUBJETIVAS NO CENTRO DA NARRATIVA

por Diego Ferreira*

A peça-filme “Derrota” a partir do texto de Dimítris Dimitriádis evidencia aspectos subjetivos no embate das contradições humanas. Parte de um universo minimalista para dialogar com questões macro, principalmente neste momento que vivemos. E esta obra e texto serem trazidos a tona neste momento é um dos grandes méritos do projeto, principalmente por evocar dimensões íntimas e subjetivas colocando a palavra no centro da narrativa. A palavra enquanto possibilidade de comunicação, extremamente elaborada e materializada através do corpo e voz de Liane Venturella, o que produz no espectador uma espécie de catarse, como se fossemos voyeur da intimidade daquela mulher. Penetramos em “Derrota” através do mundo das palavras, e através delas empreendemos a própria metamorfose da narrativa. Através da palavra dita e internalizada, construímos e reconstruímos o universo daquela mulher que sozinha em seu quarto fuma e divaga sobre suas derrotas, desejos, perdas e sonhos e isso tudo nos conecta nos provocando a criar outras dimensões sobre limites e fronteiras psíquicas e emocionais que estamos sujeitos em nosso cotidiano. E se esse cotidiano for o Brasil atual essas palavras criam outras dimensões que potencializam o discurso do texto, pois parte da materialidade do texto de Dimítris para aprofundar temas que hoje no Brasil são extremamente caros a todos nós como o caos político e sanitário. É o momento perfeito para dar uma pausa e refletir sobre nossas precariedades. Esse diálogo é necessário, é salutar, é urgente, até mesmo como uma válvula de escape, uma fuga frente ao caos.

“Derrota” é uma parceria do Coletivo Gompa e Cia Incomode-te e evidência o notável trabalho de Liane Venturella como grande atriz que é, tendo como possibilidade de criação a sua presença e toda sua capacidade de articulação através de pausas, silêncios e uma apropriação do texto que a primeira vista parece simples, mas a simplicidade nem sempre é algo fácil de acessar, e aqui sua atuação neste experimento é magistral. Assim como o trabalho de Camila Bauer que a cada trabalho se reinventa enquanto encenadora, seja na linguagem, poética ou estética, mas sempre inovando e trazendo o novo para os palcos, ou para a tela como é neste experimento. Uma produção intima, reveladora e instigante que provoca o nosso imaginário através da ótima utilização da palavra materializada no corpo e voz de uma grande atriz.

FICHA TÉCNICA
Texto: Dimítris Dimitriádis
Direção: Camila Bauer
Elenco Liane Venturella
Direção Sonora: Álvaro RosaCosta
Vídeo: Júlio Estevan
Fotos: Claudio Etges
Orientação de figurino: Fabiane Severo
Iluminação: Ricardo Vivian
Assessoria de Imprensa: Léo Sant´Anna
Produção: Letícia Vieira
Coordenação de Produção: Primeira Fila Produções
Realização: Projeto Gompa e Cia. Incomode-Te.



*Diego Ferreira é Dramaturgo, Diretor, Professor e Crítico Teatral. Graduado em Teatro UERGS/2009. Estudou Letras na FAPA/2002.  Coordena o Núcleo de Dramaturgia do Espaço do Ator. Editor do blog Olhares da Cena. Participou do Grupo de Estudos em Dramaturgia de Porto Alegre coordenado por Diones Camargo. É integrante da GiraDramatúrgica - Grupo de Estudos em Dramaturgia Negra coordenado por Carlos Canarin/UNESPAR. Professor do Espaço do Ator e da extensão na UNISINOS. Produziu “Três tempos para a dramaturgia negra no RS” contemplado no edital Diversidade nas Culturas da Fundação Marcopolo. 


sábado, 22 de maio de 2021

HIPERGAIVOTA (RS)

 

SUSPENSÃO DO COTIANO ATRAVÉS DE VIVÊNCIA INTERATIVA

por Diego Ferreira*

HIPERGAIVOTA é uma experiência digital, um desdobramento do espetáculo “Dispositivo Gaivota” do Coletivo Errática. Trata-se de uma plataforma que o espectador vai explorando através dos seus próprios gestos e cliques. “Hipergaivota” é uma das melhores experiências artísticas dos últimos tempos pela inventividade, inovação e por permitir ao navegador desbravar outras searas, através de uma vivência interativa e criativa.

Uma peça de teatro desse tempo, para esse tempo, diz o texto de abertura, e de fato se configura dessa forma. Um experimento sobre o tempo. Sobre o espaço, mesmo questionando que espaços são estes, espaços fugazes e efêmeros. Nossos dedos passeiam nervosos por salas, e cada clique abre-se uma nova possibilidade estética, uma nova visão de um pequeno mundo que se agiganta diante de nós. Fragmentos de textos, imagens, performances, sons e uma infinidade de possibilidades de juntar partes de um grande quebra-cabeça emotivo, afetivo e sensorial. O nosso papel enquanto espectador é ir entrando nas salas, absorvendo e sentindo cada proposta, brincar, se divertir e a partir daí se colocar também no jogo, enquanto peça fundamental. Diante de todas as incertezas que vivemos no mundo diante de uma pandemia, quando não sabemos do dia de amanhã, ainda surgem projetos e propostas artísticas que te tiram do eixo, que provocam uma suspensão no seu cotidiano. “Hipergaivota” é um mergulho para dentro, pois enquanto se volta para os dramas e tensões das personagens do universo de Tchekhov, também são desvelados o universo e estrutura dos performes, fragmentos de um cotidiano em suspensão, frestas de banheiros, quartos, salas e quintais, travessias que me reportam de Porto Alegre até Boston, tudo sob um olhar que coloca em evidencia a máquina do fazer artístico, a nova possibilidade de criação a partir do estar dentro, do estar apartado de um todo, do seu coletivo, de sua tribo, mas mesmo assim existe vida, existe criação e existe reverberação potente do lado de cá.

“Hipergaivota” é uma grande possibilidade de composições a partir das cenas e dos dispositivos e das ligações que o espectador vai construindo com partes ou com o todo. Impossível tecer qualquer comentário estilístico ou de atuação quando o projeto requer apenas EXPERIÊNCIA. Sim, uma experiência viva pautada pela usina criativa e virtualizada que é essa “Hipergaivota”. Parabéns ao Coletivo Errativa que juntamente com o Grupojogo não somente agora, mas a algum tempo tem ventilado as artes cênicas do estado com propostas inventivas e inovadoras mas sem desconectar do humano, e por isso são projetos universais.      

Ficha técnica

Direção e Concepção: Francisco Gick

Dramaturgia e Código: Francisco Gick a partir de “A Gaivota” de Anton Tchekhov

Adaptação: Coletivo Errática

Elenco: Claudio Loimil, Jezebel De Carli, João Pedro DeCarli, Guega Peixoto, Luan Silveira, Gustavo Dienstmann, Mani Torres e Nina Picoli

Trilha Sonora: Vitório O. Azevedo

Figurino: Gustavo Dienstmann

Concepção e Criação de plataforma: Francisco Gick

Duração: 60 min

Recomendação etária: 18 anos

 

*Diego Ferreira é Dramaturgo, Diretor, Professor e Crítico Teatral. Graduado em Teatro UERGS/2009. Estudou Letras na FAPA/2002.  Coordena o Núcleo de Dramaturgia do Espaço do Ator. Editor do blog Olhares da Cena. Participou do Grupo de Estudos em Dramaturgia de Porto Alegre coordenado por Diones Camargo. É integrante da GiraDramatúrgica - Grupo de Estudos em Dramaturgia Negra coordenado por Carlos Canarin/UNESPAR. Professor do Espaço do Ator e da extensão UNISINOS.