SUSPENSÃO DO COTIANO ATRAVÉS DE
VIVÊNCIA INTERATIVA
por Diego Ferreira – Especial Mostra
Umbú de Artes*
HIPERGAIVOTA é uma experiência digital,
um desdobramento do espetáculo “Dispositivo Gaivota” do Coletivo Errática.
Trata-se de uma plataforma que o espectador vai explorando através dos seus
próprios gestos e cliques, e que dentro da Mostra Umbú de Artes o olhar do
espectador foi guiado por um integrante do grupo que ia escolhendo em qual das
janelas nós íamos olhar, adentrar e experimentar. “Hipergaivota” é uma das
melhores experiências artísticas dos últimos tempos pela inventividade,
inovação e por permitir ao navegador desbravar outras searas, através de uma
vivência interativa e criativa.
Uma peça de teatro desse tempo, para
esse tempo, diz o texto de abertura, e de fato se configura dessa forma. Um
experimento sobre o tempo. Sobre o espaço, mesmo questionando que espaços são
estes, espaços fugazes e efêmeros. Nossos dedos passeiam nervosos por salas, e
cada clique abre-se uma nova possibilidade estética, uma nova visão de um
pequeno mundo que se agiganta diante de nós. Fragmentos de textos, imagens,
performances, sons e uma infinidade de possibilidades de juntar partes de um
grande quebra-cabeça emotivo, afetivo e sensorial. O nosso papel enquanto espectador
é ir entrando nas salas, absorvendo e sentindo cada proposta, brincar, se
divertir e a partir daí se colocar também no jogo, enquanto peça fundamental.
Diante de todas as incertezas que vivemos no mundo diante de uma pandemia,
quando não sabemos do dia de amanhã, ainda surgem projetos e propostas
artísticas que te tiram do eixo, que provocam uma suspensão no seu cotidiano.
“Hipergaivota” é um mergulho para dentro, pois enquanto se volta para os dramas
e tensões das personagens do universo de Tchekhov, também são desvelados o
universo e estrutura dos performes, fragmentos de um cotidiano em suspensão,
frestas de banheiros, quartos, salas e quintais, travessias que me reportam de
Porto Alegre até Boston, tudo sob um olhar que coloca em evidencia a máquina do
fazer artístico, a nova possibilidade de criação a partir do estar dentro, do
estar apartado de um todo, do seu coletivo, de sua tribo, mas mesmo assim
existe vida, existe criação e existe reverberação potente do lado de cá.
“Hipergaivota” é uma grande
possibilidade de composições a partir das cenas e dos dispositivos e das
ligações que o espectador vai construindo com partes ou com o todo. Impossível
tecer qualquer comentário estilístico ou de atuação quando o projeto requer
apenas EXPERIÊNCIA. Sim, uma experiência viva pautada pela usina criativa e
virtualizada que é essa “Hipergaivota”. E a exibição dentro da Mostra Umbú
terminou com uma performance que brincava com um jogo de composição através de
palavras que teve participação dos atores do coletivo de da platéia. UMA
EXPERIENCIA VIVA, e que me fez ter o gostinho de voltar ao modo presencial que
ainda não tinha experimentado nesse período pandêmico.
Parabéns ao Coletivo Errativa que
juntamente com o Grupojogo não somente agora, mas a algum tempo tem ventilado
as artes cênicas do estado com propostas inventivas e inovadoras mas sem
desconectar do humano, e por isso são projetos
universais.
Ficha técnica
Direção e Concepção: Francisco Gick
Dramaturgia e Código: Francisco Gick a
partir de “A Gaivota” de Anton Tchekhov
Adaptação: Coletivo Errática
Elenco: Claudio Loimil, Jezebel De
Carli, João Pedro DeCarli, Guega Peixoto, Luan Silveira, Gustavo Dienstmann,
Mani Torres e Nina Picoli
Trilha Sonora: Vitório O. Azevedo
Figurino: Gustavo Dienstmann
Concepção e Criação de plataforma:
Francisco Gick
Duração: 60 min
Recomendação etária: 18 anos
*Diego Ferreira é
Dramaturgo, Diretor, Professor e Crítico Teatral. Graduado em Teatro
UERGS/2009. Estudou Letras na FAPA/2002.
Coordena o Núcleo de Dramaturgia do Espaço do Ator. Editor do blog
Olhares da Cena. Professor do Espaço do Ator e da extensão na UNISINOS.
Produziu “Três tempos para a dramaturgia negra no RS” contemplado no edital
Diversidade nas Culturas da Fundação Marcopolo. Foi indicado no Prêmio
Açorianos 2021 em 3 categorias: Olhares da Cena na categoria Ação Formativa e o
projeto "Três tempos para a dramaturgia negra no RS" nas categorias
Ação Formativa e Ação Periférica.