Arrebatador!
O espetáculo “O auto da compadecida” foi até aqui a grande surpresa do Montenegro em Cena, pois conseguiu me arrepiar desde a primeira imagem que vi do trabalho. Temos aqui um trabalho que acerta em tudo. Um trabalho com uma concepção apurada e com idéias muito claras e concisas.
A encenação parte do texto de Ariano Suassuna, mas tem forte referencia na adaptação televisiva que mesclou a dramaturgia o cerne de dois de deus textos: “O auto da Compadecida” e “O santo e a porca”. Poderia ser um demérito esta referencia ao filme ou minissérie, porém o grupo se apropria muito bem de tudo isso e vai além, pois agrega a cena uma forte musicalidade. A trilha sonora é toda executada ao vivo pelos atores e isso é realmente fantástico, pois este elemento é um fator muito forte na encenação e que por isso se potencializa. Neste aspecto o grupo recria algumas canções do cancioneiro popular e contextualiza no enredo da peça, e isso faz com que a trilha se torne um forte elemento que não está apenas para criar climas e tensões, mas está ali para comunicar, para narrar e a musicalidade cumpre um papel fundamental. É lindo de se ver e ouvir um elenco afinado, cantando e se divertindo com tudo isso.
Outro elemento estético que é muito favorável na peça são os figurinos assinados por Fabrizio Rodrigues, pois todas as peças comunicam por si só, dialogam com o todo e foram muito bem explorados em suas estampas, cores, cortes e tipo de tecido. Um visual que impressiona desde o primeiro momento. A iluminação também cumpre um papel fundamental pois além de iluminar os atores, cria jogos e espaços de criação que auxiliam na encenação.
Os outros elementos estéticos foram muito bem pensados em seu minimalismo, como a maquiagem que não é exagerada, é no tom certo, exato que auxilia os atores a comporem suas figuras, assim como o cenário e os adereços, que são móveis, transformam-se e estão ali a serviço da cena.
Saliento que o espetáculo foi aplaudido em cena aberta duas vezes, e isso deve-se ao equilíbrio alcançado pelo elenco e direção. O elenco é coeso, todos tem espaços para criação, com exceção de Ivan Lauermann, que faz o padeiro, e Leandro Lotermann que faz o cangaceiro, pois estes dois atores poderiam, com o auxilio de seu diretor de aprofundar um pouco mais seus personagens, a modo que possam crescer e aparecer mais em cena, não chegam a destoar do todo, porém podem conseguir resultados mais próximos aos demais atores.
Quanto ao restante do elenco, conseguem imprimir aos seus personagens uma verdade e entrega, e tenho que destacar a Fabíola e Nicole Orth que fazem João Grilo e Chicó, pois conseguem imprimir uma verdade a estes personagens que já tem um registro televisivo muito forte no nosso imaginário e que por isso conseguem subverter esta lógica alcançando resultados ótimos. Ana Ledur, em minha opinião, é a que melhor se aproveita da sua personagem, conseguindo imprimir a sua personagem “a mulher do padeiro” um tom na medida exata, me ganha com sua malemolência e força, mas não apenas por isso, mas também pela personificação da figura do demônio, que com todos os adereços e figurinos Ana consegue criar uma figura grande, enorme que extravasa na cena, por isso merece meu destaque.
Júlio Schuster é para mim uma revelação enquanto diretor, já conhecia seu trabalho de ator, mas na direção eu realmente me impressionei muito. O grupo dá a entender que se trabalha no coletivo, que não fazem nada sozinho, mas quem assina e quem trás propostas é o Júlio e por isso merece o meu respeito por nos apresentar um produto estético tão apurado, tão bem amarrado em todos os aspectos. Júlio foi feliz em todas as suas escolhas e isso é realmente maravilhoso quando acontece. Ou seja, temos aqui um grupo de jovens atores com uma maturidade incrível que às vezes não encontramos em coletivos profissionais.
Diretor: Júlio Schuster
Autor: Ariano Suassuna Classificação etária: Livre
Contra-regra:
Operador de Som:
Criador da trilha sonora: O grupo
Operação de luz: Júlio Schuster
Criador da iluminação: Marcos Cardoso
Maquiador: O Grupo
Criador da maquiagem: Tuti Kerber
Figurinista: Fabrizio Rodrigues
Cenógrafo: Júlio Schuster
Elenco:
Fabiola Orth
Nicole Orth
Isadora Dahmer
Samuel Vier
Ana Vier
Ana Ledur
Ivan Lauermann
Vanessa Hilgert
Leandro Lotermann