domingo, 24 de novembro de 2013

EU, ÁLVARO DE CAMPOS (RS)


O espetáculo “Eu, Álvaro de Campos” foi o primeiro trabalho a participar do novo projeto da Coordenação de Artes Cênicas da Prefeitura de Porto Alegre. O projeto em questão é o “Teatro na Cia” realizado sempre as quintas feiras na Cia. de Arte.
Trata-se de um monólogo interpretado pelo ator Júlio Lhenardi do Grupo Artes e Letras dirigido por Gabriel Motta. Já tinha falado por aqui da importância deste grupo no cenário gaúcho em que se propõem a encenar textos de autores clássicos da literatura, neste caso um heterônimo de Fernando Pessoa.
Trata-se de um solo onde temos um ator empenhado que domina a cena, porém penso que há um problema na questão da transposição do literário para o teatral, pois vemos um homem atormentado com questões existenciais, porém na maior parte do tempo assistimos ao ator declamar um texto/poema entrecortado de algumas canções interpretadas pelo próprio ator e nada mais que isso. Penso que a concepção do espetáculo peca justamente em tentar traduzir um poema para o teatro, porém não consegue ultrapassar esta barreira, pois o trabalho é quase uma declamação de poemas, sendo que isso não é demérito, pelo contrário, pois Júlio tem um domínio vocal interessante, porém não alcança uma qualidade teatral justamente por não existir uma linha dramática, uma ação que justifique a presença daquele homem no espaço.
Júlio Lhenhart tem boa presença cênica e uma voz potente, porém sua interpretação se desenvolve através de uma linearidade que faz com que o espectador não adentre no universo da narrativa. Falta colorir mais o texto, recheá-lo de intensões, abusar mais de pausas e silêncios para que isso gere ações no ator e uma suspensão no espectador. Lhenhart se utiliza muito de gestos periféricos e movimenta-se de um lado para o outro enquanto experimenta gravatas e ternos, mas isso não chega a configurar uma ação teatral condizente com seu personagem. Não fica muito claro quem é este homem, onde ele está e porque tem a necessidade de dizer aquelas coisas.
Os elementos cênicos, assim como a iluminação e trilha sonora são limpos e pontuais, apenas uma ressalva a trilha sonora que poderia ser um pouco mais econômica em suas inserções, pois às vezes sua utilização serve apenas para preencher a cena e não auxilia na criação de climas para a peça. Uma sugestão seria a utilização de silêncios e barulhos do mar.
Apesar de tudo o espetáculo deve sim ser assistido e recomendado justamente aquelas pessoas que gostem de poesias, gostem de Fernando Pessoa ou que desconhecem a obra de Pessoa e que gostaria de conhecê-la, pois o trabalho reafirma o poder didático que o grupo Artes e Letras tem se proposto, a trazer para o palco grande autores da literatura.
FICHA TÉCNICA
Dramaturgia: Júlio Lenhardi
Colaboração: Altair Martins
Concepção Cênica e Atuação: Júlio Lenhardi
Direção Musical e Trilha Sonora: Marcelo Schultes
Sonoplastia e Iluminação: Kariny Schoenfeldt e Gabriel Motta
Figurinos e Cenografia: J. Alceu e Allex Manzônia
Direção: Gabriel Motta
Fotos: André Pares
Arte Gráfica: Uecla Oiluj