O espetáculo “Eu, Álvaro de
Campos” foi o primeiro trabalho a participar do novo projeto da Coordenação de
Artes Cênicas da Prefeitura de Porto Alegre. O projeto em questão é o “Teatro
na Cia” realizado sempre as quintas feiras na Cia. de Arte.
Trata-se de um monólogo
interpretado pelo ator Júlio Lhenardi do Grupo Artes e Letras dirigido por
Gabriel Motta. Já tinha falado por aqui da importância deste grupo no cenário
gaúcho em que se propõem a encenar textos de autores clássicos da literatura,
neste caso um heterônimo de Fernando Pessoa.
Trata-se de um solo onde
temos um ator empenhado que domina a cena, porém penso que há um problema na
questão da transposição do literário para o teatral, pois vemos um homem
atormentado com questões existenciais, porém na maior parte do tempo assistimos
ao ator declamar um texto/poema entrecortado de algumas canções interpretadas
pelo próprio ator e nada mais que isso. Penso que a concepção do espetáculo
peca justamente em tentar traduzir um poema para o teatro, porém não consegue
ultrapassar esta barreira, pois o trabalho é quase uma declamação de poemas,
sendo que isso não é demérito, pelo contrário, pois Júlio tem um domínio vocal
interessante, porém não alcança uma qualidade teatral justamente por não
existir uma linha dramática, uma ação que justifique a presença daquele homem
no espaço.
Júlio Lhenhart tem boa
presença cênica e uma voz potente, porém sua interpretação se desenvolve
através de uma linearidade que faz com que o espectador não adentre no universo
da narrativa. Falta colorir mais o texto, recheá-lo de intensões, abusar mais
de pausas e silêncios para que isso gere ações no ator e uma suspensão no
espectador. Lhenhart se utiliza muito de gestos periféricos e movimenta-se de
um lado para o outro enquanto experimenta gravatas e ternos, mas isso não chega
a configurar uma ação teatral condizente com seu personagem. Não fica muito
claro quem é este homem, onde ele está e porque tem a necessidade de dizer
aquelas coisas.
Os elementos cênicos, assim
como a iluminação e trilha sonora são limpos e pontuais, apenas uma ressalva a
trilha sonora que poderia ser um pouco mais econômica em suas inserções, pois
às vezes sua utilização serve apenas para preencher a cena e não auxilia na
criação de climas para a peça. Uma sugestão seria a utilização de silêncios e
barulhos do mar.
Apesar de tudo o espetáculo
deve sim ser assistido e recomendado justamente aquelas pessoas que gostem de
poesias, gostem de Fernando Pessoa ou que desconhecem a obra de Pessoa e que
gostaria de conhecê-la, pois o trabalho reafirma o poder didático que o grupo
Artes e Letras tem se proposto, a trazer para o palco grande autores da
literatura.
FICHA TÉCNICA
Dramaturgia: Júlio Lenhardi
Colaboração: Altair Martins
Concepção Cênica e Atuação:
Júlio Lenhardi
Direção Musical e Trilha
Sonora: Marcelo Schultes
Sonoplastia e Iluminação: Kariny
Schoenfeldt e Gabriel Motta
Figurinos e Cenografia: J.
Alceu e Allex Manzônia
Direção: Gabriel Motta
Fotos: André Pares
Arte Gráfica: Uecla Oiluj