quinta-feira, 24 de maio de 2018

A MULHER ARRASTADA (RS)


E amanhã estreia "A mulher Arrastada" com dramaturgia de Diones Camargo, Direção de Adriane Mottola e com Celina Alcântara e Pedro Nambuco no elenco, dentro da programação do 13º Palco Giratório RS. 
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Por Diego Ferreira[1]
 “A Mulher Arrastada” enquanto dramaturgia surge para dar corpo, voz e atenção a tudo o que vem acontecendo nos últimos dias, surge como um acalanto pós execução da Marielle. É lógico que a escrita surge muito antes deste último fato, mas serve para pensar e refletir, questionar até quando, ou melhor, quantas Cláudias, Marielles, Marias e tantas outras vão perder suas vidas e nada, absolutamente nada irá acontecer.
A escrita de Diones me toca de uma forma intensa, primeiramente, pelo fato de eu ser negro, e me identificar muito com estas memórias, e segundo que a escrita é provocativa, não esbarra no fato da premissa da peça, estar em todas as mídias, o que poderia escorregar e cair em clichês ou até mesmo na criação de uma história melodramática tentando apenas emocionar o leitor/espectador com o drama da pobre vítima Claúdia. Mas graças ao olhar apurado, “A mulher arrastada” é um texto que a começar pela estrutura, eclode o drama assim como ocorre em autores pós-modernos, como Sarah Kane e até mesmo Heiner Müller.
O texto ”A mulher arrastada” é permeado de memórias fragmentárias e inconstantes, ficção e realidade andam juntas, também a dimensão do tempo está desconstruída: não há noção de passado e presente, separação de eu e outro; em caráter de hibridismo (o texto é um poema dramático, narrativo, concreto, e extremamente político); um novo estado de expressão e percepção em uma escrita que é distante da estrutura tradicional de enredo. A fragmentação do sujeito contemporâneo é alcançada esteticamente com a utilização de recursos como as figuras do HOMEM e das SOMBRAS que tem a função de situar os passos de Claúdia, a utilização de uma narrativa não linear, não especificação das personagens e do cenário, distorção do senso de realidade e de tempo.
O trabalho de Diones é um verdadeiro “tour de force” dramatúrgico, e agora fico aqui na expectativa de vê-lo ganhar vida no corpo da Celina Alcântara que é uma intérprete maravilhosa, uma atriz negra que tem na sua força a sua razão de ser e de representar tantos e tantos artistas negros dentro da academia. Em minha opinião não tinha outra atriz a não ser ela, que foi minha orientadora na graduação. Que as palavras deste potente texto possam ecoar e quem sabe transformar o olhar de muitas pessoas para que Claudias e Marieles estejam sempre PRESENTE entre nós!

A MULHER ARRASTADA (RS)

Dias 25 e 26 de maio de 2018 - Sexta-feira  e sábado, ás 21 horas
Galeria La Photo - Travessa da Paz, 44 - Farroupilha - Porto Alegre/RS
Gênero: Teatro Adulto / Classificação: 14 anos / Duração: 55min

Inspirado no caso real ocorrido no Rio De Janeiro em 2014, a peça refaz os últimos momentos de Cláudia Silva Ferreira – mulher, negra, trabalhadora, 38 anos, mãe de 4 filhos biológicos e 4 adotivos – brutalmente assassinada pela Polícia Militar ao sair de casa, no Morro da Congonha, para comprar pão para sua família. Após ser baleada, seu corpo foi atirado às pressas no camburão da viatura e arrastado ainda com vida em meio ao tráfego da capital carioca, sob o olhar horrorizado de motoristas e transeuntes. Valendo-se de uma construção poética que contrapõe o fato verídico ao simbolismo das imagens evocadas, o texto do dramaturgo Diones Camargo mostra a figura trágica de Cacau reivindicando o que durante toda a cobertura jornalística do caso foi aos poucos apagado: o seu nome, elemento este que foi substituído pela impessoal, violenta e cruel alcunha de “Mulher Arrastada”.

Ficha técnica:
Texto: Diones Camargo
Direção: Adriane Mottola
Elenco: Celina Alcântara e Pedro Nambuco
Cenografia: Isabel Ramil e Zoé Degani
Iluminação: Ricardo Vivian
Trilha Sonora Original: Felipe Zancanaro
Fotografia: Regina Peduzzi Protskof
Produção: Francisco Ribeiro
Realização: Diones Camargo e Galeria La Photo e Espaço Cultural
Apoio: Cia/Estúdio Stravaganza


[1] Diego Ferreira é Graduado em Teatro pela Universidade Estadual do Rio Grande do Sul. Professor de Teatro na Unissinos e no La Salle. Diretor do Grupo Skatá. Faz parte da Comissão  Julgadora do Prêmio Açorianos Revelação 2018 e atualmente é membro do Grupo de Estudos em Dramaturgia de Porto Alegre coordenado por Diones Camargo.
Escreve criticas no blog Olhares da Cena http://olharesdacena.blogspot.com.br/

Publicado originalmente no Site CÊNICAS.